Paulo Pereira Cristóvão, candidato à presidência do Sporting, foi ao “Prolongamento” da TVI24, cópia repetida até à exaustão dos programas televisivos de debate futebolístico, com um representante boçal de cada clube e um moderador com óculos para dar seriedade ao programa. O pudor não impediu a estação de impedir que o “representante do Sporting” fosse “um candidato da Lista C”, o “cirurgião” Eduardo Barroso. Aparentemente, após pesquisa rigorosa e por coincidência esmagadora, as televisões escolhem sempre como “representantes do Sporting” neste fóruns “candidatos da Lista C”, já que Dias Ferreira e Rui Oliveira Costa compõem o tridente pateta dos fóruns televisivos. Sobre imparcialidade, portanto, estamos conversados.
Permitam-me uma declaração de interesses: não gosto de Eduardo Barroso. Entre os meus cirurgiões, tenho tendência a gostar mais daqueles que não se esquecem de compressas dentro dos pacientes depois de os fechar. Mas isso sou eu, que sou maniento. Há muito boa gente que até agradece a compressa e segue feliz até ao fim da vida. É verdade que essa vida é dramaticamente encurtada pela infecção provocada pela compressa, mas é uma vida muito feliz, graças a Deus.
Durante o debate, Eduardo Barroso teve apenas um objectivo: irritar o candidato. Soltou frequentemente pigarreios que, com boa vontade, seriam entendidos como sinais de anuência, mas que poderiam ser apenas notas de catarro. Descreveu os três últimos anos como “dos melhores dos últimos tempos no Sporting” [cito de cabeça]. Concordou enquanto o debate esteve na generalidade e atacou brutalmente quando ele desceu à especialidade.
Retive duas notas: com o rigor de quem nada tem a temer, comentou que Pereira Cristóvão teria muita facilidade em fazer os outros falar, insinuação delicadíssima sobre o passado do candidato como inspector da PJ. Foi lembrando entretanto que o candidato estaria apenas a promover-se, procurando benefícios pessoais pelo serviço ao Sporting. É uma acusação digna e justificada. É pena que tenha vindo do ex-presidente da Autoridade para os Serviços de Sangue e da Transplantação que, por acaso, no quadro das suas funções, entendeu remunerar-se num só mês de 2007 com 30 mil euros de incentivos pela realização dos seus transplantes. Outros serviços hospitalares em Coimbra, com noções tontas de serviço público e espírito cívico, não receberam nada. Eduardo Barroso não será muito sério, é verdade, mas é fofinho, valha-nos isso!, como um urso de peluche, que apetece abraçar. Embora com cuidado, não vá ele pespegar-nos uma compressa nas entranhas.
À despedida, depois de metralhar insistentemente o candidato, interrompendo-o, acusando-o, babando-se com tanto entusiasmo, Eduardo Barroso piscou o olho a Fernando Seara. Choca-me esta cumplicidade porque vejo nela a satisfação das elites por barrarem o acesso a um gentio. Não estava em causa um programa eleitoral ou uma questão clubística. Era bem mais feio. Estava em causa um membro alheio ao grupo que teve a distinta lata de tentar aceder ao pódio. Um marrano a querer fazer-se passar por cristão-velho, querem lá ver? Naquele piscar de olhos cúmplice, esteve a metáfora da influência arrogante das elites nos destinos de Sporting e Benfica.
Ou então Barroso precisava de uma compressa para limpar olho. Foi uma das duas.