Quem lê este blogue com alguma regularidade reconhece, sem favores, os três pilares fundamentais do nosso estatuto editorial: a imparcialidade rigorosa na defesa do fenómeno desportivo, em geral, e do fenómeno Jesualdo Ferreira, em particular; a defesa feroz da receita de caldeirada à algarvia isenta de berbigão, esse agente do mal que se esconde em muitas das nossas cataplanas; e uma integração muito perspicaz de fenómenos do Além nas explicações futebolísticas.
Alguns leitores recordar-se-ão de uma estranha sequência de eventos ocorrida em Janeiro de 2006 e aqui relatada com minúcia. No dia 27, dei meia dúzia de piruetas na auto-estrada do Algarve, proeza que me deu oportunidade de conhecer os simpáticos senhores da brigada de desencarceramento da Brisa. Dois dias depois, o Sporting ganhou por 1-3 na Luz, com exibição memorável de Liedson, Sá Pinto e Moretto. No dia seguinte, nevou em Lisboa, embora alguns jurassem a pés juntos que eram meras penas a esvoaçar. Fenómenos isolados? Bahh! É necessário um avançado estado de paranóia para não reconhecer a evidente interligação destas ocorrências rodoviárias, futebolísticas e meteorológicas.
Ontem, com a graça que Deus me deu, rachei a cabeça numa placa de metal que a CM Loulé distribui com volúpia pelas ruas de Vilamoura, sinalizando destinos úteis como restaurantes, bares e centros de enfermagem para suturar eventuais cabeças rachadas. À primeira vista, a placa ganhou por cinco pontos no escalpe a zero, mas ainda falta a segunda mão e, como diz o Cajuda, estas eliminatórias têm sempre dois jogos. Se ao menos eu tivesse marcado um pontito fora, ainda teria esperança. Fora de casa, como se sabe, os pontos valem por dois.
A maior parte dos leitores caminha seguramente, olhando em frente, o que, em retrospectiva, parece ter a enorme vantagem de evitar colisões frontais com placas de metal de sinalização. Em contrapartida, eu caminho sempre a olhar para o chão, procurando não tropeçar em buracos na calçada e evitando pisar dejectos, mas não evitando a ocasional rachadela craniana. Poder-me-ão dizer que é uma solução bastante estúpida, mas, no dia em que os senhores que caminham a olhar em frente se precipitarem para um buraco disfarçado na calçada que os levará, aos gritos, para os confins da Terra, quero ver quem rirá por último.
Enquanto isso não sucede, cá me aguento, com um penteado que fará sensação nos salões de cabeleireiro desse país a partir de Setembro: risco ao meio, dividindo irrepreensivelmente as madeixas da direita e da esquerda, e pelada ao centro.
Ora, não é difícil adivinhar que a sutura do meu escalpe foi apenas uma primeira (e dolorosa) manifestação do Oculto. Seguir-se-á um fenómeno meteorológico invulgar – provavelmente aparecerá das brumas um indesejado heterossexual no Sasha Bar. E, naturalmente, o Sporting ganhará a Supertaça ao FC Porto no sábado, o Jesualdo fará aquele ar desolado, próprio de quem foi espezinhado outra vez, o Bruno Alves verá um cartão amarelo na sequência de uma agressão bárbara e o Quaresma tomará conhecimento do resultado no dia seguinte quando folhear distraidamente a imprensa italiana.
Que eu esbarre com uma placa de metal se as minhas previsões falharem.