Mãos ao ar

Blogue de discussão desportiva. Qualquer semelhança entre este blogue e uma fonte de informação credível é pura coincidência e não foi minimamente prevista pelos seus autores. Desde já nos penitenciamos se, acidentalmente, relatarmos uma informação com um fundo de verdade. Não era, nem é, nossa intenção.

quarta-feira, dezembro 20, 2006

O Funcionário Público

Na vida, estimado leitor, tenho dois pesadelos incontroláveis: há dias em que sonho que uma gigantesca sapateira inverteu a ordem natural das coisas e me dá marretadas firmes na cabeça com um martelo para partir marisco, pesadelo muito frequente entre os apanhadores de amêijoas da costa vicentina e que Sigmund Freud interpretaria seguramente com o seu célebre dichote: bij scheikunde kunnen we altijd met hartelust spieken [N.R.: lá vêm estes piolhosos falar de lagostas e sapateiras outra vez. Rais’parta a vida, que eu não ganho para isto! Bem faz o meu primo Armando, que é guarda-livros em Innsbruck e passa a vida a mandar mails porcos!]
Noutros dias, acordo em pânico, imaginando que o Tiago, eterno segundo guarda-redes do Sporting, vai disputar um jogo oficial. Hoje, soou a primeira trombeta do apocalipse e os piores receios confirmaram-se: Tiago vai mesmo jogar na Choupana, no jogo de Taça de Portugal para ali marcado.
É dramático constatá-lo, mas o Tiago é o jogador com mais anos de Sporting no plantel. Entrou em 1997 e, à excepção de um abençoado empréstimo ao Estrela da Amadora, nunca mais desamparou a loja. Consistente, nunca mostrou particular preferência pelos métodos das dezenas de treinadores que a ele recorreram nestes nove anos: falhou sob as ordens de todos, mostrando notável regularidade em todas as características que definem um guarda-redes moderno. Não desfaz cruzamentos. Vê mal ao longe. Sai mal aos pés dos avançados contrários. Repõe as bolas em campo sistematicamente pela linha lateral esquerda, como um canhão de artilharia indefinidamente mal calibrado. E custa a bonita média de 1,5 golos sofridos por jogo.
Coloca-se, pois, a inevitável questão: como diabo se aguenta esta criatura há nove anos no mesmo clube? Resposta: nunca ninguém deu por ele! Tiago é o funcionário público da Sporting, Sad.
Tenho um amigo que é quadro médio do Ministério da Educação há mais de duas décadas. Nunca exigiu gabinete, nem pediu secretária. Nunca assinou um requerimento. Nunca se lhe ouviu a voz em reuniões. Nunca se fez voluntário para nada, nem deixou de picar mecanicamente o ponto todas as manhãs e fins de tarde. Passa despercebido, como um fantasma moderno, espectro sarcástico de uma burocracia galopante que não repara nos homens invisíveis da engrenagem.
O Tiago é parecido. Colegas e treinadores passam por ele sem se interessarem pelo vulto que lhes é familiar. Decorrem semanas sem que os jornais digam o que quer que seja sobre ele. Uma pesquisa rápida no arquivo do Record (peço desculpa. Da próxima vez, pesquisarei fontes com mais bom gosto) revela três notícias sobre ele desde o mês de Setembro: uma lesão no joelho que não o afastou dos treinos; uma arreliadora gripe que o deixou dois dias acamado; e o regresso triunfal aos treinos depois da arreliadora gripe.
Amanhã, porém, regista-se o pior pesadelo da vida de um homem invisível: alguém descobriu o seu ficheiro e convocou-o para a trincheira da frente. Logo ele, que tem pavor a confusões, vai ser chamado a provar o seu valor à frente de toda a gente. É verdade, não há transmissão televisiva [porta-te bem, Lucílio, que tu trabalhas a dois quarteirões de minha casa!], mas, mesmo assim, as suas limitações ficarão expostas a olho nu. Tenham medo, leões. Tenham muito medo!

19 Comments:

At quarta-feira, 20 dezembro, 2006, Anonymous Anónimodisse...

Hahaha excelente texto.

Tenho a ideia de o Tiago ser um bocado maricas, no livro do Boloni vinha lá qualquer coisa deste género:

"O Tiago veio ter comigo, disse que não se sentia bem que tinha umas dores e não se sentia a 100%".

(Isto após os jogadores terem sido informados de quem estava convocado para o próximo encontro, que penso que também era para a taça)


Julgo que só se mantém no Sporting porque não levanta ondas se tiver de passar 30 jornadas a puxar o lustro ao banco ou a fazer sprints para chamar os suplentes e também porque possivelmente não ganhará muito.

 
At quarta-feira, 20 dezembro, 2006, Anonymous Anónimodisse...

Urge fazer uma correcção: houve de facto uma altura em que o Tiago mostrou serviço e esse serviço foi visível para toda a plateia da 1ª Liga: quando praticamente sozinho conseguiu pôr o Estrela na 2ª divisão!

Depois desse ano, pensei verdadeiramente que não teriam coragem de o fazer regressar. No entanto...

Ponham o puto a jogar nestes jogos!!

 
At quarta-feira, 20 dezembro, 2006, Blogger ardinariodisse...

eheheheh
Bulhão, esse amigo que tu falas do Ministério da Educação... és tu não és?

 
At quinta-feira, 21 dezembro, 2006, Anonymous Anónimodisse...

Caro Bulhão Pato. Em primeiro lugar, peço humildemente perdão por apenas te conseguir responder a esta hora, mas, atendendo a que sou funcionário público não me foi de todo possível fazê-lo no habitual horário de trabalho das 9.00 horas às 17.00 horas (aqui no Porto – atendendo, provavelmente, ou ao “calor da noite” ou à mudança de fuso horário do trabalho, é das 8.00 horas às 19 horas). Tentarei, por outro lado, manipular (no sentido mecânico do termo) o melhor possível este conjunto de ecrã e teclas que tenho à minha frente e que, como decerto percepcionas, constitui um ambiente particularmente adverso para qualquer funcionário público que se preze. Ainda no plano dos princípios, procurarei não utilizar formas de expressão excessivamente tecnocráticas e que possam porventura perturbar a compreensão de qualquer vulgar leitor deste blog que não seja funcionário público.

Além de funcionário público, vê lá tu que tenho também desdita de ser… um sportinguista… a viver no Porto… Na minha modesta e certamente limitada capacidade de análise (sim, não se esqueçam que eu, apesar de sportinguista, sou apenas um funcionário público), a principal razão para a necessidade deste exercício diário de persistência (ser sportinguista e ser funcionário público), tem exactamente a ver que a circunstância de, em ambos as equipas, nos faltar guarda- redes … Ou seja, tanto os actuais guarda redes do Sporting, como os sindicatos da função pública, são incapazes de apanhar uma bola no ar, vêm mal ao longe e colocam qualquer bola directamente para fora…

Porque não fazer intervir o mercado e criar uma escola privada de formação de guarda redes (baptizando-a, por exemplo, de Compromisso (SC) Portugal)? Antevejo já guarda redes bastante confiantes nas suas capacidades, particularmente elásticos e com aquela capacidade para fazer o tradicional “golpe de rins” que os guarda redes portugueses fazem a propósito e a despropósito de tudo (não tenho a certeza desta terminologia do golpe de rins – Será de perguntar ao Freitas Lobo? Ou ao Lobo Antunes? Será golpe de pâncreas? Soa-me a qualquer coisa… Ah, sim, é o telemóvel …). Porém, esta escola, geraria Keepers (preferi, assim, porque se trata de uma designação com uma sonoridade muito mais privada) particularmente instáveis, com muitas dificuldades de posicionamento na baliza e que fazem estimativas bastante especulativas sobre a trajectória da bola, fiando-se muitas vezes no chamado “golpe de vista” (esta coisa de ter prometido não utilizar a linguagem tecnocrática, faz com que daqui a pouco esteja a falar nos automatismos do Gabriel Alves)…

Ora, salvo melhor opinião (ops, desculpa pela deformação profissional…), na (lamentável) impossibilidade orçamental do Sporting adquirir um guarda redes equiparável às resmas (não confundir com lesmas - geralmente um dos qualificativos dos funcionários públicos) de génios da gestão privada que habitam o nosso País, do que o Sporting precisa na sua baliza é mesmo de um verdadeiro e genuíno funcionário público… Só quem não conhece o enquadramento regulamentar da função pública é que admite que o Tiago pudesse ser ou continuar a ser um funcionário público. Uma coisa é não se dar pelo funcionário público, outra coisa é ele cometer múltiplos erros gritantes, situação que tanto pode dar origem a um processo disciplinar com vista ao seu despedimento, como, no caso de elevada reincidência, pode fazer com que se suponha que estamos em presença de um génio da gestão provada (perdão, privada), originando, deste modo, a sua promoção para vogal de alguma empresa pública ou até um destacamente para a banca (não confundir com o banco… de suplentes)… Ou seja, o que, de facto, o Sporting precisa é de alguém, sem grandes estados de alma e, porventura, sem capacidade para fazer defesas impossíveis, mas que não cometa erros sistemáticos em qualquer notificação, perdão, requerimento, perdão, solicitação efectuada a coberto do ofício (é isso, já se está a aproximar a hora de picar o ponto…), perdão, em qualquer (sublinho, qualquer) remate ou cruzamento…

Aguardando deferimento, subscrevo-me com os melhores cumprimentos.

 
At quinta-feira, 21 dezembro, 2006, Anonymous Anónimodisse...

Parabéns pelo texto Bulhão. Com tantas palavras e sem escrever mal do Benfica!! Estamos a progredir...

 
At quinta-feira, 21 dezembro, 2006, Blogger Bulhão Patodisse...

Vamos a feed-back:

Ardinário, estás quente, muito quente. Estás quase lá. Como já uma vez escrevi, escondo mal a minha identidade.
Aliás, eu quando vou ao urologista, tenho o cuidado de dizer: "Ah e tal, tenho um amigo que queria saber se, com 8cm de apêndice, pode cumprir as funções. E eu... quer dizer, o meu amigo queria saber o que pode fazer para melhorar!"

Anónimo, belíssimo texto. Podias perfeitamente tê-lo assinado, que nós não nos zangávamos.
Os orientais têm um velho enigma: como se sabe o som de uma árvore que tomba numa floresta vazia, se ninguém lá está para o ouvir?
Permito-me, em face da resposta, adaptar o enigma à função pública: um funcionário público chega a horas ao seu local de trabalho. Como se sabe se isto aconteceu, se não está lá ninguém para o confirmar?
Um abraço.

 
At quinta-feira, 21 dezembro, 2006, Blogger Nuno Moraes Bastosdisse...

Bulhão,

Faltou mais um registo: quando o Tiago disse, meses depois de ter afirmado o contrário, que afinal o Schmeichel era "assim-assim".

 
At quinta-feira, 21 dezembro, 2006, Anonymous Anónimodisse...

Quem cospe para cima às vezes suja-se, Jay Jay.

 
At quinta-feira, 21 dezembro, 2006, Blogger ardinariodisse...

"...Passa despercebido, como um fantasma moderno, espectro sarcástico de uma burocracia galopante que não repara nos homens invisíveis da engrenagem.
..."

"...Amanhã, porém, regista-se o pior pesadelo da vida de um homem invisível: alguém descobriu o seu ficheiro e convocou-o para a trincheira da frente."

Se o homem invisível não és tu... é o Sancho! Ou ambos. Ou nenhum. Olha, eu não sou!

 
At quinta-feira, 21 dezembro, 2006, Anonymous Anónimodisse...

Penso que perdemos um bom ponta de lança, é cada golo no aquecimento ao Ricardo. Pois, também estamos a falar do Ricardo... Saudações leoninas

 
At quinta-feira, 21 dezembro, 2006, Anonymous Anónimodisse...

parece que está tudo a correr bem (0-2)... nem o lucílio, nem o tiago (a ver se não falo cedo demais) estão com jogo. eheh

 
At quinta-feira, 21 dezembro, 2006, Anonymous Anónimodisse...

0-3

 
At sexta-feira, 22 dezembro, 2006, Anonymous Anónimodisse...

Tens toda a razão, caro Bulhão Pato. Eu (o tal anónimo), enquanto funcionário público, também assino (e rubrico) sempre os documentos que elaboro.

Porém, também eu, tal como Vª Exª, caro Bulhão Pato, tenho dois pesadelos incontroláveis.

Um deles é quando sonho que o Prof. Cavaco e o José Manuel Fernandes (apesar dos antecedentes maoistas do segundo e do primeiro, com toda a sua candura, até ser o papá do “monstro”), se acercam de mim e, com os seus conhecidos esgares pavlovianos, me interrogam: Você é funcionário público? Sim? Está disponível para se alistar na mobilidade? Não? Gostaria então de optar pela solução final? Reforma antecipada? Não, não é bem isso que estamos a pensar, enfim, sabe como é, a Segurança Social tem um buraco maior do que o do ozono. Que edifício é este para onde o estamos a levar? Não, não, esteja calmo, este nome “centro de higienização” não quer dizer nada…

No outro pesadelo, eu, sportinguista do Porto, encontro-me nas mãos da… Carolina. Não vou adiantar muito mais. Penso que a grande maioria dos portugueses adultos (por favor, não confundir com…) sabem o que isso significa…

Assim, neste momento, assinarei apenas Leão Bolhão (ndr - o Bolhão, como até qualquer lisboeta saberá, é uma zona do Porto onde está sedeado um mercado (irra, sempre o mercado…) municipal, sendo, assim, um local habitual de peregrinação de qualquer político de 4 em 4 anos – e, sim, caros alfacinhas, aqui no Porto, Bolhão, escreve-se com o…).

Com os mais elevados protestos de estima e consideração,

Leão Bolhão

 
At sexta-feira, 22 dezembro, 2006, Anonymous Anónimodisse...

Vai levar na bolha. (riso alarve)
Foi bem original esta.

 
At sexta-feira, 22 dezembro, 2006, Blogger Bulhão Patodisse...

:–D
Caro Leão Bolhão, bem-vindo. E não é preciso cá vir só para discutir a função pública. Também albergamos debates sobre globalização, a floresta tropical e o maoismo do Zé Manel Fernandes,

 
At sexta-feira, 22 dezembro, 2006, Anonymous Anónimodisse...

Com a devida vénia ao site steinhardts.wordpress.com presto aqui um pequeno serviço público gratuito ao anónimo de sorriso alarve…

Saloios e alfacinhas
Published Novembro 14th, 2006

Muita gente já fez a pergunta a quem tem melhores condições para estar bem informado. Ninguém ainda foi capaz de dar uma resposta abalizada para o facto de ser chamar “alfacinha” ao indivíduo natural de Lisboa, como este ignorante bloguista.

O certo será que “alfacinha” é um diminutivo de “alface” (Lactuca sativa) planta hortense, indispensável nas saladas. E só em português se chama assim. Em árabe (e também em hebraico) chama-se Hassa. Precedida do artigo, em árabe, é “Al-Hassa”. E como já vimos em entradas anteriores, o H gutural semítico deu F em português, temos “alface”. Por isso, os especialistas são tentados a pensar, e provavelmente com razão, que foi a invasão dos mouros que trouxe para Portugal a alface.

Haveria muitas alfaces nas hortas das colinas de Lisboa? Teria a alface servido de alimento principal de emergência durante algum dos cercos a que os habitantes da cidade estiveram submetidos? Será por algum desses motivos que ficámos alcunhados de alfacinhas? Comedores de alface? É provável. É notável a reminiscência árabe nos arredores de Lisboa e de Sintra, duas praças-fortes dos mouros, que D. Afonso Henriques conquistou.
Ao que parece, nesses arredores instalou-se uma tribo proveniente do Sahara, que em árabe se chamavam os saharauii. Daí dizem que nos veio o termo “saloio”. A mudança do R para L é comum, sahalauii, mas, mesmo assim, é uma etimologia ainda difícil de compreender, para mim pelo menos.

Mas se os entendidos dizem que os saloios vieram do Sahara, talvez também tenham vindo de lá os famosos “queijinhos saloios”, e isso já é uma boa notícia… E por falarmos do espólio árabe na língua portuguesa, tentemos reclamar mais um termo pejorativo.

Muito se tem dito e escrito sobre os significados negativos enraizados na língua portuguesa de palavras como “judeu”, “judiaria”, “rabino”, “safardana”, etc.
Das palavras, que poderão ofender os árabes, pouco se diz.

Lembro isto, não só por causa do “saloio”, com seus sentidos positivo e negativo. “Árabe”, como substantivo designativo do indivíduo, diz-se em árabe “al-arab”. Em português dizia-se “esse é um al-arave”, de onde “alarve”.

E da mesma maneira que “judeu”, também “alarve” é injusto e ofensivo, quando usados no sentido pejorativo.


Um abraço

Leão Bolhão

 
At sexta-feira, 22 dezembro, 2006, Anonymous Anónimodisse...

Cá no norte diz-se que um gajo gajo que não chateia é um manga. Se o Tiago é um manga eu num sei, mas que lá dá um jeito do caraças ao encarregado do sector num ser chateado, lá isso dá.

Bom Natal, carago.

 
At sábado, 23 dezembro, 2006, Anonymous Anónimodisse...

Caro Bulhão Pato. Agradeço a tua enorme generosidade e, sobretudo, a abertura de espírito para debatermos neste blog temas tão importantes para a nossa vida colectiva como os que referes.

Assim, depois de termos estudado como aplicar, na prática, o princípio maoísta da guerra popular com vista à dispensa do Tiago, sugiro que analises brevemente: (i) a influência do efeito de estufa sobre o relvado de Alvalade; (ii) os efeitos perversos da globalização: estudo de caso da aquisição de Carlos Bueno.

Um óptimo Natal e um 2007, se possível com o Sporting Campeão, mas fundamentalmente com muita tranquilidade e, sobretudo, sempre com Mãos ao Ar.

 
At sábado, 31 março, 2007, Anonymous Anónimodisse...

Bulhao filho da puta, a tua mae é k nao defende nada...falas do tiago dessa maneira mais uma vez....vou ate ao fim do mundo pa te foder essa cara...cabrao!

 

Enviar um comentário

<< Home