A metáfora dos lemingues
O jogo era estúpido e visualmente básico, mas entreteve uma geração de jovens com borbulhas e pouco dinheiro para consumir pornografia consagrada internacionalmente. Buscava inspiração no mito dos lemingues – a tese segundo a qual estes estranhos mamíferos do Árctico se lançam por precipícios abaixo quando verificam que consumiram numa só temporada todo o alimento disponível, inviabilizando os recursos para as gerações seguintes.
Colocado perante o desafio de encontrar outros ecossistemas ou sucumbir à adversidade, o mito diz que o lemingue toma a opção mais fácil: embebeda-se até ficar num torpor eufórico, consome tudo o que resta e suicida-se depois de um exercício inútil de psicanálise e de um telefonema para “As Tardes da Júlia”, na TVI. Os leitores mais atentos notarão que esta etapa da ecologia da espécie não costuma fazer parte dos manuais de biologia. É nesta altura que eu peço a esses leitores para abandonarem a sala. Ena, são tantos! Muito obrigado. Não empurrem. Há tempo para todos. Os quatro que ficaram podem aproximar-se do palco para ficarem mais quentinhos. Vamos lá continuar.
Ora, no jogo de computador, podia-se optar entre o lemingue escavador, o construtor, o trepador, o pára-quedista e por aí adiante. Havia depois o lemingue bombista, que se imolava (por favor, não ler “simulava”, que ainda não comecei a falar do Aimar) com uma bomba. E o mais importante deles todos: o lemingue-travão, que se sacrificava pelos restantes. A sua missão era travar a enxurrada enquanto deixava um ou dois construtores montarem as escadas de acesso à saída. Depois, não restava ao remédio ao jogador que não fosse imolar o valente e deixar a multidão salvar-se pelo caminho já desbravado.
Descontando o facto de o jogo ter sido seguramente concebido por um jihadista radical, havia uma moralidade escondida. Cá vai ela: na vida de uma organização, é tão fundamental aquele que constrói vias de fuga como... o que se auto-destrói com uma bomba amarrada ao cinto. Humm? Não, não era esta a moralidade escondida. Esperem, deve ser esta: é tão importante o chico-esperto que se oferece para ir à frente e pisgar-se logo pela calada como o totó que é voluntário para deixar os outros fugirem enquanto ele se condena ao suicídio. Humm? Também não? Enfim, estou certo de que havia uma moralidade escondida, mas alguém a escondeu bem de mais.
Não preciso de dizer aos senhores que, para mim, a estratégia do Benfica para esta temporada personifica o ciclo de vida dos lemingues. É um jogo de roleta-russa, que pode correr bem, mas tem muitas probabilidades de falhar. Admito que a tese é controversa. Basta dizer que “O Jogo” tem defendido que o Benfica caminha a passos largos para o suicídio enquanto o “Record” aposta que serão conquistados todos os troféus da época, mesmo aqueles em que o Benfica não participa. Já “A Bola” não conseguiu produzir um comentário em tempo útil, uma vez que não tinha ainda recebido do Benfica instruções sobre a opinião que deverá debitar.
À partida para mais uma época (que, para os mais distraídos, começa só amanhã. Ou, por outras palavras, só se começam a dar pontos às vitórias a partir deste fim-de-semana), a curiosidade reside em saber em qual dos cintos vão ser amarradas bombas se chegar a altura de carregar no botão de auto-destruição.
Eu aposto no Rui, da Damaia.
Não perca a crónica de amanhã, intitulada: “Esconde as ampolas, Jorge. Vêm aí os homens do controlo!”
17 Comments:
Ahahah! bela associação! o problema é que para os lemingues vermelhuscos parece sempre haver a possibilidade de fazer reset do jogo...Ainda não se lembraram de introduzir acções no Monopólio, senão até essas podiam usar...
Ahahahahahah!
A parte final está muito boa. Anda ali, ninguém dá por ela, mas diz tudo. E quando há jogo dos juniores é assim: "Esconde as ampolas, João. Vêm aí os homens do controlo!"
Os mais famosos mestres das bombas estão lá!!!
Até um idiota passa por sábio quando fica calado ...
Caro Bulhão será possivel verificar se o IP deste último comentário anónimo vem da Damaia.
Aposto o Manic Miner que sim.
LMGM,
Acho que o anónimo se referia ao Orelhas.
Já estás a tremer!!!...
Saudações.
Muuuuuuuuuuuuuuuito bom!!!
Bem, cada um tem as suas convicções.
E, malgré tout, eu respeito imenso as do Bulhão.
Mas cá para mim é mais o Nacional que é, ou vai ser, bom.
Uma palavra apenas:
Excelente!
Para o comment anterior, lampioes e afins:
Há 4 anos que andam a dizer a mesma coisa, e há 4 anos que ficam em 3o ou 4o lugar... nao haverá maneira de aprenderem? Quantos anos mais precisam de falhar para perceberem e aceitarem a verdade? Água mole em pedra dura...
pobres lemingues.
Lindo!
Só tenho medo que o nosso presidente "lemming tiros no pés" e o nosso mister "lemming travão" já se tenham auto-destruido antes da catatrósfica avalanche vermelha.
E aí só podemos esboçar um sorriso irónico, como muitos fizeram após o golo de Enshede, que nem conseguiram festejar. Outros há que continuam com comichões faciais após o golo do ... de quem foi mesmo?
«Havia depois o lemingue bombista, que se imolava (por favor, não ler “simulava”, que ainda não comecei a falar do Aimar) com uma bomba»
AHAHAH, este parentesis é de um humor refinado, é que o homem este ano está particularmente dado a mergulhos mirabolantes...
Excelente post, parabens pelo humor de qualidade e muito certeiro...a brincar a brincar...
Parabéns pelo vosso Blogue Sportinguista! Pena seja, que apenas fale do Glorioso Benfica. Já sugeri ao LFV que arranje lugares cativos para os Anti-Benfiquistas sempre poderão extravasar melhor esse sentimento de inferioridade. Saudações
Referido um ponto interessante pelo último comentário.
Penso que uma boa opção para os lagartos em geral seria a extinção da sua equipa de futebol - que exceptuando a ocasional excepção não lhes dá alegrias nenhumas - e anti-apoiarem o Benfica.
No fundo continuavam a fazer o que agora fazem: ver os jogos do Benfica, ler avidamente as noticias do Benfica torcendo para que tenham a alegria da sua derrota sem aquela chatice de ver onze marretas de verde e branco a jogar à bola.
Convenhamos que é muito mais fácil torcer para que o Quim deixe mais um furo que esperar que o Djaló marque.
Nestes tempos de dominio total do Porto, o vosso complexo de inferioridade é tão facilmente alimentado como o Rochemback numa mesa de rodizio (perdoem-me a má metáfor mas não tenho o jeito do Bolhão)
Pedia a vossa atenção para a magnifica construção frásica do meu comentário: exceptuando a ocasional excepção.
Obrigado
E pronto, o balão começou a vazar!!!
Enviar um comentário
<< Home