O teu cabelo rapado é melhor do que o meu

Comentário de “Anti-Chico Espertos” no post anterior: «(…) Sportinguistas de merda, todos betinhos com a franjinha à frente dos olhos também não sao precisos! Vêm mal, é da franja. Tens franjinha Bulhão? é que viste mal!
 Levantem a peida da cadeira e saiam de Lisboa para sentirem a camisola! estão aí e só sabem é falar mal. São os primeiros a enterrar mas os enterras são vocês. Mudem para o Benfica ou para o Porto que são maiores. Betos intelectuais! Devem ser daqueles que vão para o jogo com um cachecol miniatura para esconder no final não vá a coisa correr mal.»

Há quem diga que não há nada que nos faça sofrer. Por acaso, eu discordo. Só quem nunca entalou a cabeça de um dedo mindinho na porta giratória do Atrium Saldanha pode dizer uma barbaridade dessas. Quase tão doloroso como isso é, como se viu em cima, ter alguém a apontar-nos o dedo à franja – sobretudo quando nos falta alguma preparação para o debate capilar que se avizinha. Eu não sou, está bem de ver, especialista na polémica cabelereira, mas vejo-me arrastado para a arena pelos cabelos e por alguém com pêlo na venta. Esbracejemos então, como dizia o meu primo Aurélio, antes de morrer afogado no rio Nabão sem desconfiar que tínhamos substituído o oxigénio da sua garrafa de mergulho por geleia de mirtilo.
É importante que se diga que leitores como o “Anti-Chico Espertos” fazem falta a qualquer caixa de comentários. Eles recordam-nos que não há debate democrático bem sucedido que dispense um ingrediente básico: o fanatismo religioso. Esse é aliás um princípio elementar da retórica, partilhado pelos discursos memoráveis de Sócrates na ágora grega, de Cícero no fórum romano e de Valentim Loureiro na praça de Fânzeres: ao berrar a nossa tese a plenos pulmões, poupamos a maçada de ouvir os argumentos dos outros. O “Anti-Chico Espertos” cumpre admiravelmente esse papel.
Dividamos as réplicas. O “Anti-Chico Espertos” indigna-se justamente com as franjas de cabelo que pendem, rebeldes e desafiadoras, sobre os olhos de uma vasta legião de sportinguistas e que impedem uma visão parcimoniosa da realidade. É importante que não calemos a indignação perante um escândalo destes. Eu próprio, em intervalos regulares do meu dia, páro muitas vezes o serviço aqui na repartição para me indignar com as malditas franjas. É verdade que o “Anti-Chico Espertos” é vago no ataque que desfere: com as franjas, ou com as ainda mais repulsivas franjinhas, sabemos já como lidar com elas – implacavelmente. Mas há toda uma zona cinzenta que permanece por escrutinar. E a mise? A poupa à Pompadour? O rabo-de-cavalo? A permanente à José Veiga? Ficamo-nos ou atacamo-los sem piedade, de tesoura em riste, como o Eduardo Beuaté? “Anti-Chico Espertos” não diz. Mas eu, farto de ver tanta mise nas bancadas, iniciarei a campanha.
Por outro lado, “Anti-Chico Espertos” lidera um movimento mais abrangente: repugna-o saber que há gente com o rabo nas cadeiras em Lisboa! Ao abrigo da sua proposta revolucionária, só levantando o rabo das cadeiras e saindo de Lisboa (imagino que seja esta a ordem, porque me parece pouco prático sair de Lisboa e só depois levantar o rabo da cadeira, mas há gente capaz de tudo!) se conseguirá sentir a camisola. Neste momento, sigo à letra metade dos conselhos de “Anti-Chico Espertos”: ainda estou em Lisboa, mas estou a escrever de rabo levantado. Ainda não comecei a sentir a camisola, como “Anti-Chico Espertos” garantiu que eu sentiria, mas já deixei de sentir os músculos dos gémeos. Deve ser bom sinal!
Por fim – e vou deixar de lado a insinuação torpe de que o meu cachecol é minúsculo porque a mim sempre disseram que não é o tamanho do cachecol que interessa, mas sim a forma como o colocamos em actividade –, “Anti-Chico Espertos” tece considerações sobre o gigantismo de Benfica e FC Porto¬. Tenho alguma dificuldade em abordar a questão: eu sempre pensei que o Sporting era enorme, mas aparentemente o Benfica é maior. E dizem que o FC Porto também não é pequeno. E eu é que sou o sportinguista de mer**?
Como “Anti-Chico Espertos” muito bem sabe das suas leituras de Heisenberg, o observador altera a experiência. É possível que eu, aqui fechado em Lisboa – embora, não me canso de o dizer, de rabo levantado da cadeira – não tenha a experiência de ver por esse país fora o tamanho do Benfica e o FC Porto. Mas posso garantir, pelo que vejo em Alvalade, que se o Sporting fosse mais quente e doce, tinha caramelo na pele. E isso deve contar para alguma coisa, caramba! [Mesmo com um guarda-redes cretino que agarra uma bola atrasada por um colega!!!]