A Irmandade
Há décadas que os sociólogos se martirizam com uma questão insolúvel: para onde vai um árbitro quando se reforma? Onde se esconde? Será que, como os lemingues, caminha em fila indiana em direcção a um precipício? A ideia é reconfortante, mas, hélàs, é falsa.
É inaceitável que o árbitro, habituado a pavonear-se no relvado com um galo, cioso do seu decisivo papel, tenha de regressar ao anonimato da sociedade civil. Ele, que comandou as paixões de milhares de pessoas, não pode ser levianamente remetido para o fim das filas de supermercado, para o anonimato das listas de espera dos hospitais. Ele, que teve o mundo preso pelo som do seu apito, não pode ser atirado de volta para o seio da gente simples, da gente bruta, da gente rústica.
Aproxime-se, leitor. Chegue-se mais próximo do monitor, pois vou sussurrar um segredo… Eh lá!… Tanto, também não, que já fiquei cheio de perdigotos.
Os árbitros, dizia eu, formam uma irmandade secreta, um ramo da maçonaria dedicado aos desportistas. Já reparou que nunca mais ninguém viu Veiga Trigo? Ou Carlos Valente? Ou Mário Leal? Não acha estranho? Numa sociedade perfeita, eles teriam sido devolvidos à dependência bancária ou à lezíria alentejana de onde foram resgastados, mas não… Eles desapareceram da face da Terra.
A perturbadora verdade é esta: quando se reforma, um árbitro retira-se para o esconderijo secreto da irmandade, no subsolo das cidades. Foge do escrutínio dos cidadãos-adeptos e recusa que o vulgar apaniguado da bola o veja, decadente, barrigudo. Gasto. O rosto que envelhece. A visão que se deteriora (mais ainda....). O cérebro cada vez menos perspicaz (menos ainda...).
Dir-me-á o leitor mais desconfiado: e Coroado? Continuamos a levar com ele anos depois da sua abençoada reforma. Continuamos a escutar as absurdas explicações das “glândulas mamilares” como causas para evidentes mãos na bola. Infelizmente, Coroado não foi aceite pela irmandade. Depois de metaforicamente morto para a arbitragem, ficou no purgatório intermédio – demasiado idiota para o mundo dos vivos, demasiado maçador para o mundo dos ex-árbitros. Valeu-lhe a TVI, que lhe pegou. Não é por ser idiota e maçador que um fulano não tem lugar na estação. Vejam o caso do Manha. E do Sousa Martins. E de tantos, tantos outros.
Nesta irmandade, descobri, é ponto de honra que só entra quem tiver largamente ajudado o Benfica. Não basta um servicinho isolado, coisa circunstancial, tipo Paraty no Benfica-Sporting do ano passado. É preciso prestar serviços relevantes à causa para ter acesso a esta galeria subterrânea.
Ah, senhores, a vida no subsolo é encantadora. E é vê-los, ao fim da tarde, trocando velhas histórias de proezas, como pescadores reformados das fainas do mar do Norte.
“Eu, uma vez, marquei dois penalties seguidos em Alvalade a favor do Benfica”, diz um, mais velhote. “É que o malandro do Nené falhou o primeiro.” Todos se riem.
“Cá a mim, nunca me enganavam. Gamei tanto, tanto, tanto em 1993/1994 que até me convidaram para o jogo de honra, na Luz, para festejar o campeonato”, lembra outro, com sotaque de Setúbal.
Mais gargalhadas.
“Uma vez, o Sporting acabou com nove jogadores na Madeira, contra o União, graças aqui ao menino”, gaba-se um terceiro.
“E eu, eu? Uma vez, apitei um Estoril-Benfica no Algarve e fui tão fanático, tão fanático, que até calcei as botas dadas pelo roupeiro do Benfica. E não descansei enquanto o Estoril não ficou com nove em campo!”
Peramte a epopeia do Benfica-Académica de domingo passado, não me custa a acreditar que o jovem Artur Soares Dias já tenha arranjado lugar cativo nesta irmandade. Imagino-o no futuro, velho e macilento, de cabelo esbranquiçado destacando-se numa roda de reformados, presos a cada palavra da sua narrativa: “Eu, uma vez, fui tão faccioso, tão faccioso, que inventei um penalty p’ró Benfica, tirei outro à Académica e ainda validei um golo irregular, marcado depois de um centro feito para lá da linha de fundo e efectuado por um jogador em fora-de-jogo. Os gajos da Académica até espumavam. Queriam ir embora. E eu, a rir por dentro, impassível. Apeteceu-me festejar com os Diabos Vermelhos, mas contive-me. Até parecia mal…”
Seguramente que, na intimidade desta sala privada, os colegas do artista não se privarão de um sentido hip, hip, hurra! E o ex-árbitro, limpando uma lágrima marota, agradecerá com voz trémula: “Só tenho pena de não ter ajudado mais. Ajudar o Benfica é dar de beber a um milhão de portugueses!”
19 Comments:
És sp a mesma merda. Estavas a ir bem até chegares ao Benfica. Depois perdestes a lucidez. Quem te ler até julga que o Benfica é mais beneficiado do k os tripeiros. Foda-se. Vcs são sp os coitadinhos.
E o árbitro do Sporting - Leiria. Aquele que não viu um golo grosseiro do Renato. Esse também aí está?
Campeões somos nós. SLB 4ever.
Esse do Sporting-Leiria está noutra irmandade: aquela onde estão os árbitros que não assinalam fora-de-jogo antes de um jogador centrar uma bola que entra na baliza onde está um guarda-redes chamado Ricardo. É uma irmandade menor, nem sequer tem direito ao subsolo, a sede é numa sub-cave.
Lindo!
Oh Jay Jay. Essa de que o Sporting é ajudado pelos árbitros é boa. Grande piada! Tu és o clube do regime. Capacita-te dessa merda e deixa-te de histórias.
Gostava era de voltar a ganhar na luz com um golo irregular. Pode ser que apareça o gajo que empurrou o Jardel há uns anos atrás.
Por isso, gramo ganhar aos lagartos com golos irregulares! E se possível apontados pelo Simãozinho!
Bonito, bonito é o Simãozinho a encavar o golito. Isso é ké bonito.
O que estou a rezar é para quem vcs nem cheguem às competições europeias para ver se fechanm a loja antes de 2010. Ficam com o Academia para alugar aos gimbras do norte da Europa cheios de reumático. E para os observadores das aves do Tejo.
Já agora ó Bulhão, o teu treinador no Glorioso não foi o Olímpio?
É que já me passou pela cabeça que tenhas jogado na mesma equipa que eu... Pelas tuas descrições lagartas da experiência...
E eu, quando era árbitro que nã podia ver o Járdeli caindo que marcava logo um pénalte. Era tã lindo. Atão, e o sportem tinha que ser campeão, na éi?!
Lamentável, caro Bulhão. Costumavas parecer inteligente. Enganaste-me bem.
Já agora, um abraço ao Tonel. Fez um grande golo e uma belíssima defesa, com direito a controlo de bola e tudo, com a mão, dentro da área, mesmo em frente do bandeirinha... perdão, do juiz auxiliar. No tempo em que eles eram bandeirinhas viam estas coisas.
E vão quatro anos a vê-los passar... Por isso é que falam tanto do Glorioso - olhar para a próprio casa deve ser doloroso. Pode ser que o Paredes vos agrave a humilhação. Deus me ouça! Deus me ouça!
Guitarrista,
Nunca quis dar a entender que era inteligente. Nem sequer percebo como nasceu tão absurdo boato.
Ouve lá: há mesmo um Sancho ou tu desdobras-te em dois quando queres mandar umas bocas. É que este Sancho me parece muito parecido contigo.
Descobriste-me a careca, JJ. O Sancho não existe. É só uma identidade que eu assumo quando preciso de parecer mais velho (põe velho nisso) e resmungão.
Aliás, seguindo a mesma lógica de raciocínio, desconfio que Pinto da Costa e o Bola 7, adepto figueirense de futebol de praia, são a mesma pessoa. Já reparaste que nunca ninguém os viu juntos? Quando um aparece, o outro, misteriosamente, desaparece.
Ahá!
Fantástico! (tenho autirização do Mourinho para utilizar a palavra) mais uma vez... Epá e se tiveres sido treinado pelo grande Olímpio ainda venho cá espreitar mais vezes. Senão... venho na mesma... O que mais me diverte é mesmo imaginar a cara dos lampiões depois de lerem os posts. Os comentários que fazem são bem indicadores disso...
De um leitor incondicional!!
Jay Jay:
reclamo a minha identidade própria. Não sou nem queria ser o Bulhão, é verdade que sou mais velho (melhor, tenho maior experiência de vida) mas não sou tão resmungão como ele quando o Sporting não ganha. Aliás, não creio que o Bulhão tenha comprado dois cativos em Alvalade, um para ele e outro para um alter-ego. Ah, e vemos os jogos lado a lado, mas com opiniões diferentes... excepto no anti-benfiquismo. Aí, somos da mesma raça.
Eh lá! Alto aí!! O verdadeiro Sancho Urraco sou eu.
Que tristeza de post.
se é para isto que escreves não vale a pena.
a verdade é só esta:
Não ha duvida no penalty que o simão marcou
no segundo lance mesmo que o luisão quisesse defender a bola não conseguia
o segundo golo do benfica é limpinho
o unico erro do arbitro foi não expulsar o jogador da académica que agrediu o beto na primeira parte.
MAs vocés querem acreditar em historias e depois queixem-se da situação do vosso clube. Já passámos pelo esmo no tempo do Vale Azevedo.
Ninguém pára aquela merda. Este ano ainda vai ser pior. Vai desde espancamentos no aeroporto a facadas em Tábua, a gamanços em todos os estádios, entrevistas altamente culturais do Orelha, enfim... é um fartar de vilanagem.
PS)Desculpem, mas acho que o Jay Jay descobriu o Sancho e o Bulhão. Os seres humanos são sempre susceptiveis de serem descobertos, os outros como ele (vulgo lampiões)é que são uma raridade...
Excelente. Verdadeiramente brutal, Bulhão Pato. Na época 2004/2005, a irmandade parecia a União Europeia - abrigou mais dez novos estados membros.
A Irmandade teve, na época de 2004/2005, um autêntico record de reservas para entradas futuras. Parecia o alargamento da União Europeia. Ele é Mários Mendes, ele é Brunos Paixões, Antónios Costas... Só me pergunto, no meio disto tudo, a que irmandade pertencerá Cunha Leal. Será que, futuramente, irá partilhar a sala de convívio com o Veiga?
Se isto não fosse ipsis verbis a realidade, até tinha piada, assim é triste, muito triste.
Enviar um comentário
<< Home