Monstro Sagrado
Chateiam-me os consensos nacionais, a imbecilidade levada ao extremo colectivo. Em ano de Campeonato do Mundo, toda a boa gente tem de apaparicar a selecção brasileira, em nome da relação histórica com o país irmão. Nas competições europeias, moem-nos o juízo com os apelos ao civismo desportivo e ao respeito pelas cores nacionais. Quando havia brasileiros na Fórmula 1 (Barrichello não conta, tenham paciência), queriam que puxássemos por Piquet e Senna. Eu até puxei - vai em frente, Senna! Agora, é o Chelsea que se tornou desígnio nacional e não há jogo transmitido pela Sportv que não inclua um chorrilho de palermices sobre o clube mais português da Premier League. Patetices! Tenho mais afinidade com o Middlesbrough de Doriva e Rochemback do que com o Chelsea de Mourinho, Ferreira e Carvalho. O Chelsea é tão português como o caviar Beluga é de Castro Marim.
O supremo desígnio nacional chama-se Eusébio da Silva Ferreira. Não há quem o conteste. Eusébio não participa na sessão de fotografia do plantel do Benfica porque estava a curar uma ressaca, e a ausência é branqueada. Eusébio chega atrasado à concentração da selecção, e ainda o aplaudem. Eusébio assiste, tremelicando, ao Rússia-Portugal e chamam-lhe embaixador do futebol português e monstro sagrado. Lá monstro ele é. O resto fica ao critério de cada um.
Defendo a tese que Figo é melhor do que Eusébio alguma vez foi. Soma mais internacionalizações pela selecção e participou em mais fases finais do que o moçambicano (Euros'96, '00 e '04 e Mundial'02 versus Mundial'66). Jogou em duas equipas de primeiro plano do futebol mundial e aguentou-se dez anos na Liga Espanhola, sem quebras de rendimento. Quando o dão por finito, reforça o Inter de Milão, terceiro gigante em onze anos de carreira internacional.
Em contrapartida, Eusébio deixou-se ficar pelo comodismo do Benfica. Em 1963, com duas Taças dos Clubes Campeões Europeus, Eusébio tinha duas opções: partia para Espanha e Itália e tornava-se uma estrela planetária ou ficava por cá, pelo conforto da Liga Portuguesa, medindo forças com o Beira-Mar e o União de Tomar. Ganhou uma Bola de Ouro? Também Figo. Ganhou campeonatos? Também Figo. Carregou a selecção às costas? Figo fê-lo durante mais anos e com melhores resultados. Eusébio teve o ponto alto na reviravolta com a Coreia do Norte em 1966 (5-3). Figo viveu-a com a reviravolta face à Inglaterra (3-2).
Provavelmente, Figo nunca será reconhecido como principal figura do futebol português. É mais confortável apaparicar Eusébio, o tal que precisou de vinte takes para gravar o spot de um electrodoméstico em 1986. O tal que não consegue articular duas frases seguidas de manhã e à tarde já só consegue dizer: "Mais um gin?" O tal que é inconveniente e maçador, insistindo em relativizar tudo porque também lhe aconteceu a ele - Ronaldo perdeu o pai. Ele também perdeu a mãe. A selecção perdeu na Coreia. Ele também perdeu em Inglaterra. Mantorras tem um joelho de metal? Ele também teve um que apitava nos detectores do aeroporto.
Façam um favor ao país e deixem de levar o monstro sagrado nas digressões da selecção. O rei está morto. Longa vida ao novo rei, Luís I.
3 Comments:
O Eusébio não bebe, isso é uma calúnia Sr. Bulhão Pato.
Sei de fonte segura que esse senhor está proibido de entrar naquela tasca chamada Catedral da Cerveja que se situa no estádio que é propriedade da Somague, já que esgotava todos os barris de cerveja e desde aí, por desgosto, deixou de beber
Não o podem enterrar já com funeral de Estado para não o termos que aturar!
Não o podemos conservar em formol, pelo menos. Correríamos sempre o risco de o homem o beber!
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