Mãos ao ar

Blogue de discussão desportiva. Qualquer semelhança entre este blogue e uma fonte de informação credível é pura coincidência e não foi minimamente prevista pelos seus autores. Desde já nos penitenciamos se, acidentalmente, relatarmos uma informação com um fundo de verdade. Não era, nem é, nossa intenção.

sexta-feira, setembro 19, 2008

Contra-natura


Consideremos esta tartaruga. Em rigor, o texto de hoje não se debruça sobre o bicefalismo, sobretudo porque, até há bem pouco tempo, o autor destas linhas acreditava que os únicos animais bicéfalos eram as lulas que gostavam de homens e mulheres. Mas é com truques baixos destes que eu me governo e faço os leitores avançarem entre parágrafos. Não será muito honesto, não senhor, mas é assim que ganho o dinheiro que põe cigarros na minha mesa…
Intrigam-me os adeptos que, durante as semanas europeias, acodem aos sites noticiosos respeitáveis, e também ao Record Online, para apelar desesperadamente ao patriotismo. Eles são o equivalente aos bons samaritanos do recreio, ensanduichados entre dois sopapos, procurando ingloriamente perceber em que momento começaram, eles próprios, a enfardar. Eles são o senhor voluntarioso que se impulsiona como uma mola cedendo o lugar à velhinha, antes de perceber que toda a carruagem está sentada e o olha com o mesmo semblante superior com que as pessoas com narizes normais observam o Júlio Isidro.
O adepto patriota é como a tartaruga bicéfala (cá está, a referência não foi gratuita). É contra-natura, um erro de programação. A paixão por um clube só faz sentido se ela coexistir na medida exacta do ódio por um clube da mesma grandeza. Amar o Inter sem odiar o AC Milan é uma perda de tempo. Tal como vitoriar o Manchester sem desprezar o Arsenal. Ou amar o Oriental sem odiar o Benfica.
Todos nós temos o nosso trauma juvenil que transportamos penosamente como uma cruz até ao Calvário. Ou talvez só até Alcântara, dependendo do passe social intermodal. O meu resultou de uma experiência escolar no liceu mais próximo do Estádio da Luz. Como é bom de ver, dos 30 meninos da turma, 28 eram do Benfica, eu era do Sporting e o Manelinho entretinha-se a vestir e a despir um Action Man com saiotes e combinações enquanto assobiava músicas dos Wham.
Naturalmente, nos jogos de bola, 28 meninos queriam jogar na posição do Nené, eu queria jogar na posição do Damas e o Manelinho queria jogar na posição de missionário.
Evidentemente, e porque os factos que aqui penosamente descrevo ocorreram em simultâneo com o período a que em Alvalade chamamos a “década da Grande Fome”, as segundas-feiras eram particularmente penosas. Habituei-me por isso a ser do Gotemburgo em 83. Do PSV em 88. Do Milan em 90. Do FC Porto em... enfim... de há 30 anos para cá.
Tenham por isso paciência. Há gestos para mim socialmente impróprios, como esperar que o Benfica ganhe a quem quer que seja, limpar as unhas com um garfo ou comentar num urinol para o parceiro do lado: “Pelo som que escuto, a sua próstata parece adequada e funcional.” Não está na minha natureza, pronto.

quinta-feira, setembro 18, 2008

Ringrazio....


mamma ke mi ha fatto bello, sano e Napoletano (pelo menos, nos próximos 15 dias).


(Cortesia MSI)

terça-feira, setembro 16, 2008

Sem fé


Uma das minhas virtudes é a capacidade de antecipar os desfechos escondidos de uma sequência de ocorrências que parecem desconexas ao olho destreinado. Exemplifico.
Há uns meses, fui talvez o único em Portugal a perceber que o Tratado de Lisboa fora assinado sob coacção dos ministros europeus. Na altura, o governo Sócrates ponderou a utilização dos piores instrumentos de tortura que o mundo já conheceu, como a roda de despedaçamento, a cadeira das bruxas ou o programa do Goucha. Acabou por optar pela actuação de Dulce Pontes com rolos na cabeça e um saco de serapilheira a fazer de vestido *. Colocados perante aquela figura de olhos esbugalhados como um caboz, uivando como um animal ferido, mesmo os renitentes polacos assinaram o primeiro papel que lhes colocaram à frente, antes que ela cantasse outra.
Ora, eu antecipo para o jogo de hoje uma provação. Estou sem fé. Pior: estou com medo de ser passado a ferro no Nou Camp como aconteceu no Bernabéu.
Há tempos, contaram-me que a lenda fundadora da Catalunha fala de um dragão terrível que existia em Montblanc. Apesar da tentação, esse dragão não pagava viagens a árbitros; ao invés, escolhia um dia por mês e investia com bestialidade sobre a localidade catalã, como o estrangulador de Mafamude do último Benfica-FC Porto. Um dia, os aldeãos decidiram fazer um sorteio para escolher a pessoa que, mensalmente, seria sacrificada ao dragão para amainar a fera, um pouco como faz o plantel do Benfica que tira à sorte o desgraçado a quem toca em destino ser atendido pelo departamento médico do clube. E se é verdade que o sacrificado de Montblanc ainda podia dar às pernas e tentar fugir da besta, aos lesionados do Benfica só resta mesmo coxear loucamente para longe da marquesa. Em vão.
Voltemos à lenda.
A ideia resultou até ao dia em que a sorteada foi a filha do rei. Protestou naturalmente o soberano que, nestas coisas, a gente não gosta nada de ver chegar o dia em que os filhos saem de casa, mas reza a história que um cavaleiro (San Jordi; ou São Jorge, em português; ou são Golüne oy çok veren talihli, uma vez que o senhor era turco) se apressou a enfrentar a fera. Munido de uma lança na mão esquerda e de uma Nova Gente com o Cláudio Ramos na mão direita, San Jordi derrotou a besta e ficou com a princesa.
A lenda é bonita e tal, mas receio que o Sporting vá hoje fazer a figura do aldeão sacrificado para amainar a fera ferida. Oxalá me engane.

* À sua responsabilidade: clicar na imagem permite mais detalhe, mas também pode deixar-lhe marcas para sempre.

quinta-feira, setembro 11, 2008

Ainda não recebi...

...nenhum Powerpoint sobre os dotes do Quim à baliza.

quarta-feira, setembro 03, 2008

Mesmo eu não sou tão javardo...

Quaresma, no Mais Futebol:Queria voltar a um grande clube!

A ingratidão, quando é sincera, pode ser tão bonita.

segunda-feira, setembro 01, 2008

Carta aberta ao senhor com chifres plantados na cabeça


Não te conheço, mas simpatizo deveras contigo.
És obviamente alguém que gosta de juntar conforto e elegância no trajar e poucas coisas são mais confortáveis e elegantes do que um pano de louça a cobrir a cabeça, adornado por dois chifres proeminentes, que parecem saudar o nascer do novo dia com o entusiasmo típico dos estetas.
Não te conheço o nome, nem creio que isso importe face ao gesto que entendeste mostrar ao país. Chamar-te-ei apenas número 13, em parte porque era esse o número do nosso Eusébio no Mundial de 1966, em parte porque tens de começar a habituar-te a chamarem-te por um número nos próximos 5 a 10 anos, com condicional a partir dos 4.
Gostei de ti mal te vi a trepar a vedação. Senti no teu gesto a angústia de Proust – não o piloto de Fórmula 1, coitadinho, que esse não violava propriedades, mas o outro, que procurava o tempo perdido, ao passo que tu procuravas o fora-de-jogo que, sentado na tua cadeira, intuíste ter sido mal assinalado. É verdade que Marcel Proust tinha publicado vários tratados sobre estética antes dos 30, mas tu tens um maciço de barba cuidosamente aparado, pêlo a pêlo, crosta de cotão a crosta de cotão, que não fica a trás. E não deixes que te diguem... hrum hrum... digam o contrário.
Imagino-te a estufar na tua cadeira, lívido de raiva e indignação. A tua camisola com o Diabo Vermelho estampado (um Malhoa?) e os teus chifres presos ao pano de louça esvoaçam ao sabor da injustiça. Gritas, primeiro, com o bandeirinha, quando ele pune Quim com um penalty: malvado sejas por essas ofensas aos olhos de Deus e, mais grave ainda, ao olho do meu menino! E berras. E vociferas. E pedes castigo. E bufas-te. E os outros à tua volta riem-se.
Chega o minuto 20 e transformas-te em Vlad, o empalador. Trepas a vedação como um soldado que sai da trincheira. Chegou a hora da retribuição por todo o mal que o Porto te causou: os títulos acumulados, as humilhações nos confrontos directos, o stent que te introduziram na bexiga quando eras miúdo. Vais, pela verdura, vais formoso mas não seguro, como Leonor – não a Pinhão, imbecil, que essa até pode ser segura, mas perde em formosura para um escaravelho-bosteiro. A do Camões.
Caminhas para o bandeirinha. A tua bancada pausa a respiração, certa de que trinta anos de castigos vão ser finalmente compensados por uma tareia das antigas, a cargo do homem com chifres na cabeça. Medes bem a distância. Visualizas o golpe como o senhor Miagi. Afastas o pano da louça que te tapa os olhos. E, por fim, tão perto da consagração, passas-lhe a mão pelo cachaço e pisgas-te a correr.
Imagino-te, pesaroso, na tua cela improvisada dentro do estádio, pensando com os teus botões: ora bolas, esta proeza foi quase comparável a estar cinco dias sem passar pela água do chuveiro, coisa que já fiz, ou a beijar uma rapariga, coisa que um dia ainda hei-de fazer.
Mas, caramba!, não pensem que generalizo ou que coloco todos os adeptos do Benfica no mesmo alguidar. Tenho o discernimento suficiente para perceber que, embora quase todos usem panos de louça na cabeça, amparando chifres proeminentes, apenas uma pequena percentagem pratica invasões de campo. Faça-se essa justiça!