Mãos ao ar

Blogue de discussão desportiva. Qualquer semelhança entre este blogue e uma fonte de informação credível é pura coincidência e não foi minimamente prevista pelos seus autores. Desde já nos penitenciamos se, acidentalmente, relatarmos uma informação com um fundo de verdade. Não era, nem é, nossa intenção.

segunda-feira, outubro 31, 2005

Onde se Fala dos Outros

Sempre que vejo o FC Porto de Co Adriaanse a jogar penso no Iran Costa a gritar “É o bicho! É o bicho!”; penso nas milícias sandinistas avançando com forquilhas contra as metralhadoras governamentais; penso no exército português em Alcácer-Quibir (embora tente não pensar nos êxitos musicais de José Cid – ora aí está uma contradição de termos). E também penso na Isabel Figueira, mas é mais raro.
A equipa é maçadora, enfadonha. O jogo é mastigado, lento, pausado. O Ibson como maestro aborrece-me mais do que duas projecções seguidas de cinema português. Hugo Almeida é mais estático do que o défice de Estado. E os centrais são como as represas que protegiam Nova Orleães: rompem por todos os lados.
Arthur Conan Doyle postulou que quando estiver excluído o impossível, tudo o resto, mesmo o mais improvável, deve ser verdadeiro. A máxima aplica-se ao FC Porto. O quadro de jogadores não tem paralelo no futebol português. A organização do clube e a articulação entre futebol de formação e futebol profissional é o exemplo que todos seguem. As infra-estruturas (embora pagas por todos nós, indirectamente, moremos ou não em Vila Nova de Gaia) são do melhor que temos em Portugal. A capacidade de inserção de trabalhadores imigrantes na estrutura do clube é lendária, pois o FC Porto é um farol na integração de brasileiras, moldavas, ucranianas, caboverdianas no mercado de trabalho. Qual é então o elo que quebra? Adriaanse, sem dúvida.
As dispensas de Jorge Costa e agora Postiga são grotescas. Bruno Alves e Ricardo Costa são tão compatíveis como uma banheira cheia de água e um secador ligado à corrente (acreditem em mim, rapazes, não experimentem isto em casa). Dispensou-se Sandro mas Ibson ficou. McCarthy é o melhor ponta-de-lança do plantel, mas fica sentado no banco ou no hotel à espera das cabeleireiras. Quaresma é utilizado a conta-gotas em benefício de Alan!
Admito que, em Julho, pensei que o FC Porto acertara em cheio, mas eu também não sou exemplo para ninguém. Também pensei que o vocalista dos Trabalhadores do Comércio seria o ícone musical dos anos 1980. E que as letras do Rui Reininho faziam sentido no contexto político dos 1990. Ou que Rui Baião seria o novo Rui Costa, da mesma forma que Akwá fora o novo Eusébio.
Senhor presidente do FC Porto, sei que lê avidamente estas linhas. Só há um treinador de gabarito que poderá amenizar o seu balneário, conciliar os jogadores com as suas posições naturais e equilibrar as prestações da sua equipa de semana a semana. Chama-se José Vítor dos Santos Peseiro e sei que está livre no mercado.

sexta-feira, outubro 28, 2005

Vale

Sempre que o Sporting se encontra na mó debaixo, não compro jornais e evito ver qualquer programa desportivo que passe na televisão. O Bulhão desliga o telemóvel e só está contactável pelo telefone verde cujo número poucos têm acesso. É nessas alturas que procuro a cura. Tal como o treinador Manuel José fazia sempre que se sentia em baixo - passava o vídeo dos 7-1 ao Benfica para se animar - eu passo horas a fio, sem me cansar, a ver e a rever deleitado os 7-0 do "meu" Celta de Vigo ao Benfica. Nem imaginam como me sinto recompensado e com a moral a níveis elevadíssimos!

Mas quantas coisas mudaram durante a minha ausência, que expliquei devidamente no "post" anterior. Peseiro, Caixinha, Eduardinho, Andrade e Dias da Cunha já cá não moram, Paulo Bento e Soares Franco assumiram os comandos da nau leonina, Carlos Freitas regressou, o Porto ganhou na Liaga dos Campeões, enfim, tudo perece voltar à normalidade. O Benfica ganhou ao Estrela com um golo invalidado à equipa da Reboleira e eliminou o Leixões da Taça com um golo irregular do pequeno gnomo. Sim, realmente tudo voltou à normalidade.

Também fui pondo as contas em dia em relação ao Mãos ao Ar, e congratulei-me com o movimento pró-Vale e Azevedo que se iniciou nestas páginas. É uma atitude benemérita e que tem por fim regenerar a imagem que o antigo presidente do Benfica detém junto dos milhões de admiradores. É este tipo de acções que me fazem ter um orgulho enorme no Mãos ao Ar.
Por motivos profissionais, só contactei com José Vale e Azevedo por uma vez. Antes de ir, eu, que me tenho por um ateu convicto, fui a uma igreja, abeirei-me do confessionário e foi com bastante angústia que disse ao padre: "senhor, perdoai-me, porque vou pecar". "O que vais fazer, meu filho?", inquiriu. "Vou ao estádio da Luz..." Ainda hoje estou para perceber se ganhei ou não o perdão, porque o padre, espavorido, fugiu a correr pela igreja, benzendo-se a cada passo.
Bom, o certo é que acabei por entrar nos estaleiros da Luz e franqueei as portas do gabinete de Vale e Azevedo. Sentado numa cadeira de mogno e ladeado por uma bandeira do Benfica e outra de Portugal, um homem com o ar sereno dos justos cumprimentou-me afavelmente. Via-se que era pessoa de bem. Com um ar magnânimo que faria Alexandre Magno corar de inveja, Vale e Azevedo respondeu a todas as minhas perguntas, e via-se que havia seriedade e humildade em todas as respostas. Depois do café trazido por uma elegante funcionária que trajava de verde, levantei-me e dei a entender que, por mim, a entrevista estava terminada. Vale levantou-se e acompanhou-me à porta. À despedida, não consegui esconder o que me ia na alma e disse-lhe: "Presidente, espero sinceramente que continue por muitos e bons anos à frente do Benfica!". Vale sorriu condescendente e retorquiu "que Deus o oiça..."
E se, pelos vistos, não há justiça divina, que sejam os homens que lhe façam justiça - assinem a petição para o trazer de volta ao lugar de onde nunca devia ter saído. Aqui

Razões de uma ausência

Foi com grande surpresa e espanto que tomei percepção de como a minha figura foi vilmente denegrida nas últimas semanas. Fui alvo, até, de uma segunda traição por parte do Bulhão Pato, que, como se não bastasse ter posto em causa a minha qualidade de amuleto, apelidando-me de agoiro, ainda se deu ao desplante de colocar um Edital ameaçando-me cobardemente de me expulsar do elenco dos criadores deste blogue. Não lhe reconheço autoridade para tal e, que eu saiba, a expulsão só pode ser levada a efeito em reunião de assembleia geral. Ainda pensei emancipar-me, proclamar a independência, fazer um blogue realmente isento. Mas pensei melhor, matutei seriamente no assunto, e achei que o Bulhão Pato merecia uma segunda oportunidade. Estás perdoado, Bulhão, embora ainda não consiga perdoar teres jogado - e mostrares orgulho nisso - com a camisola de um clube pelo qual denoto um ódio visceral.

Foi com tristeza, ainda, que ao rever os comentários de alguns leitores, dei conta de que fui torpemente insultado - preguiçoso, vergonhoso, mandrião, sapo, gay, esclerosado, decano repórter e neto de visconde rabiado foram alguns dos termos aqui utilizados. Que falta de imaginação!

Pois bem, é confrangedor perceber que fui caluniado durante a minha ausência, e logo quando estive numa missão de alto gabarito e que envolveu inúmeros riscos. Físicos e morais.
Duarante duas semanas, palmilhei milhares de quilómetros pelo Sudeste Asiático, neveguei pelo Chao Phraia acima desde Bangkok, atravessei o interior rural do Laos, subi e desci várias vezes as ruínas de Angkor Vat, refugiei-me na aldeia de Myang Ho para fugir à junta militar que governa Myanmar, perdi-me nas ruas de Ho Chi Minh, percorri a grande muralha da China de ponta a ponta. E tudo porquê? Porque prometi a mim próprio que deveria prestar um serviço à Humanidade - descobrir, descodificar e encontrar a cura da gripe das aves.

Regressei e posso dizer que a missão foi coroada de êxito. O epicentro deste surto gripal não se iniciou, ao contrário do que pensa toda a comunidade científica internacional, no continente asiático. O perigo espreita-nos, pois a maléfica doença começou a propagar-se a partir de Portugal. Não deixa de ser irónico que tenha feito uma demanda por paragens tão distantes quando o segredo, a revelação, estava aqui ao virar da esquina. O foco da gripe das aves e que se está a espalhar um pouco por todo o mundo, nasceu, por questões de malformação genética e hereditária, na águia Vitória. Sim, essa mesmo, aquela que faz de símbolo de um clube de bairro e que vive numa gaiola imunda no estádio da Coca-Cola. A solução está à vista de todos e não há nada como cortar o mal pela raiz - mate-se o galináceo ou, na pior das hipóteses, faça-se-lhe uma laqueação das trompas. A Humanidade agradece.

quarta-feira, outubro 26, 2005

Mãos à Obra, Rapazes

Nestes tempos de hoje, a solidariedade é muitas vezes uma palavra oca, mas nós, no Mãos ao Ar, não somos ingratos. Gostamos de honrar quem nos tratou bem. De servir quem nos guiou espiritualmente. De ajudar quem pode pôr o Benfica no trilho certo.
João Vale e Azevedo é o mentor do nosso blog, o guru da nossa jovem comunidade, o nosso Siddharta Gautama, o nosso subcomandante Marcos, o nosso Xanana Gusmão. Mas ele, como todos os santos, é um homem modesto e acanhado. Humilde e sincero. Na vida não quer mais do que um escasso quinhão de bens terrenos, a comunhão dos amigos e um ou outro iate registado em Itália.
No Mãos ao Ar, a solidariedade não é apenas uma palavra que o Luís Filipe Vieira não sabe soletrar. Tomámos por isso em mãos a reabilitação do nosso presidente. Criámos uma petição, aproveitando as maravilhosas ferramentas digitais de hoje, que visa reabilitar o Homem e a Causa. Junte-se a nós aqui e vote, vote muitas vezes. Lembre-se: o que der hoje ao Benfica receberá a centuplicar no paraíso.
Para os mais preguiçosos, que não queiram votar mas apenas consultar o texto da petição, aqui fica o essencial:

João Vale e Azevedo foi injustiçado. Foi preso por delito de opinião (e por um ou outro furto qualificado, mas, admitamos, que em Portugal isso não é bem crime). Deixou um projecto de longa duração incompleto. Ajude-nos a recuperar Vale e Azevedo, o homem que fará do Benfica um clube ímpar entre os contribuintes do Estado português. O Benfica expulsou-o de associado, mas, com a sua ajuda, reabilitaremos o Homem e a Causa. Ajude-nos a terminar a injustiça. Ajude-nos a pôr fim à barbárie. Ajude-nos a colocar Vale e Azevedo no cadeirão de presidente do Benfica.
Como uma petição também deve ser apelativa, tomámos a liberdade de produzir umas quadrinhas de apoio que, devidamente musicadas, têm todos os condimentos para se tornar o próximo êxito de Verão do mercado nacional discográfico.

Balada do Bravo Azevedo
No Colombo, na Luz e noutros pontos do reino,
há milhares de benfiquistas de fato-de-treino.
De garrafão, linguiças, unhas grandes e zurrando aos céus.
que melhor clube para o Khadafi dos pneus?

Fio de ouro ao pescoço e unhaca amarela
Voz de cana rachada, conduz um táxi na Arrentela.
Finais perdidas já leva muitas, mas não é vingativo
Na última que ganhou, ainda Kennedy estava vivo.

João, João, presidente ideal
Tornaste o Benfica um paraíso fiscal.
Não páres, não desistas – não deixes de lutar.
Com a tua ajuda, a risota vai voltar.


Os versos são deste vosso servidor, verdadeiro poeta multifacetado e animador de baptizados. Bem hajam!

terça-feira, outubro 25, 2005

Edital

Nos termos previstos pela lei, faz-se constar que se inicia hoje, aos 25 dias do mês de Outubro, um prazo de cinco dias úteis colocado por Bulhão Pato (daqui para a frente identificado como o contestário) a Sancho Urraco (identificado como o contestado), que terminará com a expulsão do contestado como contribuinte do blog Mãos ao Ar, caso não produza, no intervalo temporal determinado, um texto digno de nota.
Está pois o contestado formalmente intimado de que se espera da sua parte um post digno até dia 31 – seja ele em redondilha ou em cantiga de amigo, em narrativa épica ou, conhecendo profundamente a personagem, em monólogo monótono.
Dada a avançada idade do contestado, aceitam-se dissertações sobre temas bem distantes no tempo, que fazem já parte da arqueologia, ou mesmo da paleoarqueologia, do futebol português. Apesar das lamentáveis lacunas da idade, provocadas pela avançada esclerose do contestado, esperam-se textos únicos sobre os duelos épicos de 1907 entre o Carcavelinhos e o Fósforos, sobre a inauguração da velha estância de madeira ou mesmo sobre os jogos fictícios disputados pelo Futebol Clube do Porto quinze anos antes da sua existência formal (cumprimentos do pseudo-historiador Rui Guedes). O nosso decano repórter (ponham decano nisso) terá certamente muito a dizer ou, pelo menos, a balbuciar.
Diz-nos algo sobre os matches dos anos 1910, Sancho. Abre a porta para os interiores esquerdos dos anos 1930. Revela tudo sobre o famoso campeonato de Portugal ganho pelo Olhanense. Pensando bem, basta dizeres qualquer coisa, Sancho. Mostra pelo menos que ainda respiras… antes que a malta desligue a máquina por engano.
Estas disposições ganham efeito a partir da manhã de dia 31. Que se cumpra a lei.

domingo, outubro 23, 2005

Transacções com o Diabo

Julgo que, nesta fase, os leitores que me acompanham terão uma ligeira suspeita de que não nutro especial afeição pelo Benfica. Terá por isso chegado a altura de retirar o véu sobre o tema oculto e desvendar, com pompa e circunstância, a resposta ao segundo maior tabu que entretém a blogosfera portuguesa (o primeiro tabu é naturalmente o debate em torno do filho transformista de Nené e se a garbosa filha reflecte, ou não, a forte liderança do pai.)
Dizia eu que o segundo maior tabu da blogosfera portuguesa pode ser expresso na seguinte dúvida metódica: gostará Bulhão Pato do Benfica? Informo nesta fase os meus leitores de que, quando se fala no Benfica, tenho tendência a transformar-me no Jardel e a falar de mim na terceira pessoa do singular. Pois bem: a verdade é que Bulhão Pato não gosta do Benfica. Bulhão Pato abomina o Benfica. Bulhão Pato não hesitaria em negociar a alma com o diabo em troca de uma derrota estrondosa do Benfica. Aliás, já o fez em transacções bem sucedidas em 1988 e 1990.
Quis o destino que a minha carreira desportiva me levasse ao clube dos meus ódios. O destino, para além de cruel, também é brincalhão, como aliás Shéu Han sempre suspeitou – ele que tinha quatro dedos numa mão, enquanto Álvaro Magalhães, do mesmo plantel, tinha seis. Fosse o destino justo e os dedos certos seriam distribuídos por cada um destes erros da natureza, mas já postulámos, no interesse do post, que o destino é cruel e brincalhão. Avancemos, pois.
Infantil como sempre fui, desenvolvi na Luz aquilo que os psiquiatras chamam de dupla personalidade e esquizofrenia acentuada. Também desenvolvi pé de atleta, mas isso, por norma, os psiquiatras não curam. Ora, na Luz, antes de cada jogo, nas habituais “molhadas” que se estabelecem antes de o cinco-base entrar em campo, enquanto os colegas gritavam a plenos pulmões “Benfica, Benfica”, eu gritava “O caral***! O caral***!” A vida corria bem, sorridente, até ao dia em que os colegas se mantiveram calados e o velho pavilhão Borges Coutinho estremeceu enquanto o meu berro irrompia pelos céus. Creio que inscrevi o meu nome nos anais do basquetebol regional português, como o primeiro a receber uma advertência antes do jogo propriamente dito. É matéria que gostaria, aliás, que os historiadores certificassem.
Percebi, nessa altura, enquanto as moedas de 25 escudos e as caricas de Joy Laranja chuviam à minha volta, que estava a viver uma experiência extrasensorial. Aos 15 anos, muitos jovens descobrem a sua verdadeira cor clubística e outros descobrem que, embora filhos de coronéis reformados das Forças Armadas, moradores em Fernão Ferro e votantes no CDS, gostam mais dos vídeo clips dos Village People.
Ora, em linguagem religiosa, tive então uma Revelação. O diabo, senhor galante de quem aliás só posso dizer bem, propôs-me uma troca comercial: em troca do meu sentido de decência, deu-me o Chifrudo (não, Nuno Gomes, ninguém te chamou!) um profundo e acentuado antibenfiquismo e garantiu-me várias décadas de intensa alegria.
Mas quando se realizam transacções com o Senhor dos Infernos, um dos problemas é a ausência de contratos escritos. Combinam-se verbalmente décadas de jejum desportivo, e Satã rói a corda à combinação, baseado num pormenor técnico, terminando a graça onze anos depois. Enfim, não se pode confiar em ninguém hoje em dia.
Ser antibenfiquista é pertencer a uma seita pujante, com membros disseminados por todo o país. É não temer a gripe das aves se isso implicar que uma certa galinha de bronze for infectada. É desejar alvejar a tiro o António Manuel Ribeiro, dos UHF, de cada vez que ele abre a boca. É ambicionar soltar um bloco de betão armado na cabeça do António Sala de cada vez que... enfim, de cada vez que ele inspira uma golfada de O2 e expira outra de CO2.
Nesta religião, temos feriados – o 25 de Novembro é o mais importante, pois marca o aniversário do memorável 7-0 de Vigo. Temos santos, dos quais o valenciano Miguel é o mais recente. E temos mártires – gente nobre, que sacrificou a sua carreira em benefício da continuada deterioração da equipa de futebol. Ricardo Rojas, Tahar el Kalej, Paulo Madeira, Bermudez e tantos, tantos outros.
Uma seita necessita ainda obviamente de um guru, um ideólogo religioso, um mestre da reflexão capaz de enquadrar as questões modernas que atormentam os fiéis. O nosso chama-se João, como o apóstolo. Vale e Azevedo de apelidos terrenos. E os seus ensinamentos foram compilados numa obra marcante e cuja leitura é cultivada por jovens de todos os países, em parte pela abordagem metódica, em parte pelo tom assaz divertido. Chama-se Relatório e Contas do Benfica relativo ao triénio 1997-2000.

quinta-feira, outubro 20, 2005

Carregue no Botão para se Autodestruir

Era uma vez um efemeróptero, insecto peculiar, pouco maior do que um dedo do Álvaro Magalhães, que fazia a sua vidinha no rio Danúbio. Ora este efemeróptero, como todos os parentes da sua criação, tinha a aborrecida particularidade de viver a cem à hora. Eclodia, apressava-se a copular e morria ao fim de poucos minutos. Era pouco tempo de vida, bem entendido, mas estas coisas dos insectos funcionam muito à base de cunhas e o efemeróptero, está bem de ver, estava mal relacionado. O seu ciclo de vida era mais efémero do que o êxtase do Secretário nas velhas noites da selecção nacional. Embora, ao que dizem, o efemeroptero não decepcionasse ninguém. Proeza de que nem todos se poderão gabar...
A epopeia relâmpago do efemeróptero já foi sobejamente descrita pela ciência, mas submeto, perante o vasto auditório, que o Sporting é o primeiro clube desportivo que vejo com vontade de a aplicar, extrapolando para o desporto o mesmo ciclo de vida aventuroso dos adoráveis insectos. É aliás fenómeno que gostaria de ver estudado com argúcia.
Expliquemos: que outro clube consegue em três meses destruir a equipa de futebol que tão bem jogara na época passada e a transforma numa amálgama de mortos-vivos indignos, até, de figurar num vídeo clip do Michael Jackson? Que outro clube deixa partir os seus melhores dirigentes sem pestanejar? Que outro clube abdica dos seus jogadores mais prestigiados e lhes dá uma sapatada ao fim de longas épocas de trabalho? Poucos, admitamos. Mas, só por si, estes casos não chegam para substanciar a minha tese.
Que outro clube vende o seu pilar do meio campo no último dia do prazo de inscrições sem acautelar a sua substituição? Que outro clube desperdiça em quatro jornadas uma vantagem de oito pontos sobre o rival - depois, até, de lhe ter ganho? Em que outro clube dois jogadores andam à batatada e o presidente acha tudo normal? Em que outro clube os jogadores substituídos mandam o treinador levar aqui e acolá sem receberem castigos exemplares?
A lista prossegue, monótona, como um inventário científico. Em que outro clube o presidente insulta as claques ao domingo, o responsável da SAD janta com eles à quarta-feira e ao domingos eles voltam a insultar a direcção do clube? Em que outro clube a lista de indisponíveis por maleita muscular supera largamente a dezena de jogadores desde o início da época? Em que outro clube o treinador chora baba e ranho quando decide sair? Em que outro clube o presidente sugere que as decisões por ele tomadas foram impostas por um bando de rufias? Que outro clube chega a Outubro sem treinador, presidente, director desportivo, administrador, telefonista e guarda-nocturno?
Admitamos, sem reservas, que o Sporting é pior do que um monge franciscano: flagela-se sem parar e retira das chibatadas intenso e vigoroso prazer. O clube atravessa uma rápida fase de belenensização, perdendo perigosamente fatias consideráveis da massa associativa e esbanjando oportunidades sucessivas de marcar pontos desportivos. Como o proverbial efemeróptero, conseguimos fazê-lo sozinhos, sem ajuda dos adversários, num notável exercício de autodestruição regular.
O FC Porto ou o Benfica não precisam de agir - na sombra ou às claras. O Sporting implode como as torres de Tróia. Peço por isso encarecidamente que alguém carregue no botão de autodestruição de uma vez por todas. É menos doloroso e sempre se fecha um ciclo com 100 anos (verdadeiros, sem fraudes históricas). Os números redondos impressionam mais nas lápides funerárias.

quarta-feira, outubro 19, 2005

Saco de pancada

A malta enxovalha-o. Insulta-o. Ridiculariza-o. Chama-lhe nomes e descobre-lhe vícios terríveis. Difama-o. Questiona a sua capacidade profissional, o seu clubismo, a sua masculinidade. Mas a verdade é que vamos ter saudades. A gente habitua-se a dar dois ou três pontapés por dia no saco de boxe de estimação e, quando ele se rompe, sentimos falta. O toureiro de Coruche vai fazer falta. Não pela capacidade técnica, mas por aquela forma tão cristã de apanhar bordoada de todo o lado e dar sempre a outra face.
Resta perguntar à Juve Leo, verdadeira cabeça pensante do Sporting contemporâneo, quem quer para treinador? Não são eles os notáveis que (des)fazem equipas técnicas no clube?

domingo, outubro 16, 2005

Vende-se

Vende-se bilhete de época para o Estádio José de Alvalade (pela última vez, não é Alvalade XXI). Bem localizado, zona calma e tranquila, com razoável ângulo de visão para arremesso de objectos na direcção do banco do treinador dos visitados. Longe das turbas violentas dos dois topos. Vizinhança pacata, mas com notáveis capacidades de agoirar qualquer jogo. Aceita-se qualquer preço. Vendedor desesperado.

Basta!

Já chega! Não há mais espaço de manobra, nem há mais crédito. Não há margem de progressão nem pontinha de sorte que nos valha. A equipa do Sporting joga mal.
Há um mês já jogava mal. Agora joga pior, infinitamente pior.
Há um mês aceitavam-se algumas lesões musculares. Agora elas são inconcebíveis.
Há um mês toleravam-se experiências tácticas. Agora elas são ridículas e ofensivas.
Há um mês aceitava-se a falta de fôlego para o quarto-de-hora final. Agora, ela é suspeita de incompetência.
O Sporting foi sucessivamente inferior ao Halmstad, ao Paços de Ferreira e à Académica. O que falta mais quando já olhamos para o calendário e sentimos calafrios com a perspectiva de jogar em Barcelos ou receber o Varzim?
Peseiro esgotou o crédito. Não faz definitivamente parte da solução, mas faz parte do problema. E atrás dele há uma longa lista de pragas a extirpar. A decisão tem de ser tomada hoje. Ou os Imbatíveis do ano do centenário arriscar-se-ão mesmo a inscrever o seu nome na história do Sporting. Pelos piores motivos.

Golpe de Marketing

Como quaisquer bloggers presunçosos, vigiamos atentamente os dados do sitemer para conferir quem nos visita, de onde vem e para onde fugiu. É uma existência triste, já se sabe, mas lá se vai passando. Uns dias, melhor; outros, pior.
Nos últimos dias, através do Google, recebemos vários visitantes enganados que digitaram expressões como "DZRT no Funchal" ou "DZRT - Bonecos - Venda" no Google e acabaram neste pardieiro. Descontando o facto de alguém pesquisar na Internet o que quer que seja sobre os DZRT, vislumbrámos aqui uma oportunidade de ouro para aumentar exponencialmente o número de visitantes, explorando ao mesmo tempo a ingenuidade dos cibernautas, os gostos perversos dos portugueses e as lacunas do motor de busca mais famoso da Internet. Assim, com sua licença, estimado leitor, cá vai: "Vídeos do Taveira Gratuitos", "Celebridades Nuas", "Benfica Campeão sem Ajuda das Arbitragens", "Aldrabices do Vale e Azevedo", "Nuno Gomes é Cornudo", "César Peixoto e Vítor Baía", "DZRT, Vítor Baía e César Peixoto", "João Catarré e César Peixoto", "José Castel-Branco no balneário do Benfica". Venham a nós os pobres de espírito. E é isto. Agora, vejam lá. Não apareçam aqui por engano!

Crónica de Televisão

Hoje em dia, qualquer criatura que se preze publica crónicas televisivas na imprensa da República. Ora não sendo eu menos do que os outros e gozando dessa inesperada coincidência de acumular os cargos de accionista, presidente, administrador, redactor e colunista do blog Mãos ao Ar, lanço-me na espinhosa missão de comentar um programa desportivo de televisão. Aos leitores, prometo o habitual rigor, polvilhado com a isenção e seriedade que servem de pilares a tudo o que escrevo. Pilares tão rígidos como os da Ponte Hintze Ribeiro, acrescento.

Entre os muitos quistos sebáceos que engorduram as páginas dos jornais desportivos nacionais, tenho especial carinho pelos jornalistas estatísticos. Sem vocação para o trabalho de rua e sem especiais contactos nas vários tribos desportivas, alguns repórteres escondem-se nas alas mais escuras das redacções, com uma mão nos “Cadernos de A Bola” e outra na calculadora. Agarraram a missão de transformar informação em dados quantitativos e realizam-na com afinco. Cabe-lhes gerar números, muitos números, para tornar a publicação do texto oportuna e plausível aos olhos de editores e leitores. Eles são a enzima digestiva do jornal – absorvem dados e digerem-nos até eles se parecerem com qualquer coisa semelhante a uma notícia. Mas no estômago, como nos jornais, há enzimas mais eficazes do que outras e as congestões são frequentes. Basta porém de jargão gastroenterológico.
Sabia o caro leitor que o FC Porto marca um golo aos 35 minutos, sempre que beneficia de dois cantos antes dos 15 minutos? Ou que Karyaka marcou golos de pontapé de bicicleta em todas as ocasiões em que jogou acima do paralelo de latitude 37º N? Ou ainda que o Sporting ganhou ou empatou todos os jogos que disputou a 16 de Outubro? É este o caudal típico de informação gerado pelos jornalistas estatísticos. Prosa rica, já se vê. Sumarenta. Credível. Suada.
Desconheço os índices de penetração destas notícias, mas adivinho que as páginas em que são publicados estes curiosos trabalhos deverão ter tanta afluência como o corredor de produtos de limpeza e higiene dos supermercados Continente. Ou não fosse o português o indivíduo asseado que todos conhecemos. Mas, aparentemente, alguém as lê (eu, por exemplo), porque as prosas numéricas multiplicam-se sem parar como pedras nos rins (Foi a última analogia morfológica, prometo).
A televisão começou, aos poucos, a abraçar o formato. Chamou essa sumidade – em oposição a nulidade – chamada João Querido Manha, comentador formoso mas não seguro, tão fluente perante as câmaras como um bosquímano do Kalahari. Mas sem estalidos, bem entendido. Em televisão, dizem os críticos, quem não mata a câmara, é morto por ela. Manha já foi assassinado há vários serões. Simplesmente, ainda ninguém lhe transmitiu a notícia do óbito.
No programa desportivo nocturno da TVI, Manha pede frequentemente licença para falar, mas é mais ignorado do que os deputados de Os Verdes na Assembleia. E ele cala-se, taciturno, rangendo os dentes. Por vezes, quando um dos convidados interrompe o discurso para inspirar uma golfada de ar, Manha lança-se «de carrinho» perante a oportunidade. «Tem piada isso que diz, Manuel Cajuda. Os dados estatísticos comprovam que, perante um lançamento lateral, os jogadores da Naval costumam conceder outro logo a seguir.» Os convidados olham-no de soslaio, indecisos entre um olhar sério de reprovação ou uma gargalhada condescendente. Optam normalmente pela segunda, o que costuma provocar um súbito encolhimento do nosso querido Manha, que começa a afogar-se no fato e a fazer-se pequenino.
Por vezes, é o locutor da TVI que o chama à acção, procurando potenciar o custo de utilização de um dos holofotes do estúdio que lhe está apontado. «Ó João, que te parece este arranjo táctico do Benfica?» Resposta pronta e afiada do nosso guru da matemática: «É muito curioso teres chamado a atenção para isso. Recordo ao espectador que, em cada vinte cantos que o Benfica sofreu, doze não resultaram em absolutamente nada. E isso diz tudo sobre o trabalho específico de Koeman que, aliás, no Ajax, marcava golos a cada 36 lançamentos laterais pela banda esquerda.» O comentador da TVI fica normalmente boquiaberto e seguramente com vontade de inquirir os presentes como o mestre-escola: «Excluindo o João Querido Manha, alguém tem coisas interessantes a dizer sobre a pergunta que coloquei?»
A Manha, gostaria de dizer, com a solenidade que o momento exige e plagiando indecentemente um velho episódio dos Monty Python, “você é demasiado pateta para aparecer na televisão”. Mas temo que ele me respondesse: «Tem piada isso que acabou de me dizer. Cada jogador que insulta o treinador ao ser substituído na primeira parte marca um golo três jornadas depois. Pense nisso!»

quinta-feira, outubro 13, 2005

Ódio de Estimação

Admito que fui sempre do contra. Quando todo o cinema torcia pelo Bambi, solidarizei-me ternamente com o caçador. Quando todo o Sporting votou em Jorge Gonçalves, coloquei a minha cruzinha no inenarrável António Simões (que, ao que sei, é hoje estivador na doca de Lisboa). Votei Salgado Zenha quando o país se bipolarizou entre Soares e Freitas. Torci pelo corretor Pedro Caldeira quando ele desfalcou metade de Lisboa (afinal, o que é uma pequena extorsão entre amigos?) No caso Casa Pia, estou indiferente à sentença, mas acho que aquela parka vermelha do Bibi era motivo, só por si, para uma pena de 12 a 14 anos. Acho a Teresa Guilherme mais sexy do que a Bárbara Guimarães e a Ana Zanatti mais masculina do que os DZRT. E, por fim, quando todo o país se apaixonou pelo Mourinho, eu pus-lhe defeitos e menosprezei cada vitória do Chelski.
Mourinho tem o raro poder de me irritar. Plenamente convencido de que é a melhor coisa que aconteceu à humanidade desde a invenção da roda, Mourinho mente, manipula, inventa. Retira importância aos jogos que perde e exagera o valor dos que ganha. Exemplos? Eliminado da Taça de Inglaterra pelo Newcastle, apressou-se a lembrar que jogara sem titulares, que tivera lesionados e que o campo estava impraticável. Esqueceu-se que aquele Newcastle até com José Peseiro perdeu. Eliminado da Liga dos Campeões por um Liverpool que lhe foi superior, colocou em causa o golo vitorioso dos «reds» e nem uma palavra teve para elogiar Benitez.
Nunca se lhe ouve um elogio ao adversário. Nunca perde sem questionar a arbitragem (lembram-se de Barcelona, no ano passado?). Nunca reconhece que a sua verdadeira força são os rublos do trapaceiro Abrahamovich. E, já agora, nunca admitirá que a sua equipa produz espectáculos mais chatos do que a esmagadora maioria dos cineastas portugueses. Com o plantel do Chelsea, até o professor Neca era campeão em Inglaterra. Ou o Luís Campos.
Fenómeno curioso: em Portugal, os portistas amuaram de Mourinho. Insultam-no agora, vislumbrando defeitos onde antes viam a fonte de todas as virtudes. Os benfiquistas, esses, reconhecem-lhe méritos divinos, elogiam-no sem vergonha, como se o homem tivesse sido burilado na Luz.
Um dia, Mourinho vai tombar como o capachinho de Fernando Gomes em dia de temporal. Um dia, ele vai perder a valer. Um dia, espero, ele vai cair em desgraça. E nesse dia Mourinho vai assistir à dissolução da aura beata que criaram em torno das suas pseudo-proezas. Jimmy Durante escreveu: "Trata-os bem quando fores a subir porque os vai encontrar quando fores a descer." Cá estaremos para ver Mourinho mais desvalorizado do que as acções do Sporting. E para lhe rasgar a camisola, como ele fez em Alvalade.
O rancor é uma atitude tão bonita.

domingo, outubro 09, 2005

Mudança de Estratégia

Ao longo destas curtas semanas de existência do Mãos ao Ar, fruto da experiência consolidada de muitos anos de ligação ao fenómeno futebolístico, fizemos prognósticos consistentes para determinados desfechos nacionais e internacionais. Apostámos no Ruanda e na Nigéria frente a Angola. Depositámos a nossa confiança no Sporting frente ao Halmstad. Fomos adeptos, por solidariedade clubística, da campanha do FC Porto na Liga dos Campeões. Por etiqueta e boas maneiras, fomos de todos os clubes que já mediram forças com o Chelsea do intragável Mourinho. O resultado? Provou-se que o nosso apoio é pior do que um surto de Ébola ou um crash informático. Minámos equipas consistentes, destruímos projectos ganhadores, desequilibrámos formações habituadas a ganhar. Em suma, o nosso apoio espatifa mais uma equipa do que uma horda de Juve Leos numa área de serviço da A1.
Perante isto, entenderam os promotores deste blogue que era fundamental modificar a sua estratégia. Em semana de «clássico», queremos deixar bem claro que faremos um corredor de solidariedade em favor do Benfica no próximo jogo com o FC Porto. Seremos mais vermelhos do que um município do Alentejo profundo. O nosso lampião [candeeiro] estará mais vivo do que a luminária de um bordel de Bragança. Apaixonámo-nos pela Nova Catedral como os DZRT pelo quarto escuro do Finalmente.
Por solidariedade, começámos ontem a emborrachar-nos diariamente, de forma a viver e sentir o quotidiano como um benfiquista de gema. Até ao próximo sábado, cultivaremos um bigode farfalhudo "à Toni", imagem de marca e distinção entre os adeptos do nosso novo clube. Começámos também a ler "A Bola" e já não nos rimos com os editoriais militantes do José Manuel Delgado.
Aos nossos olhos, o presidente Luís Filipe Vieira deixou de ser um possível traficante de estupefacientes. Agora, é um empresário dinâmico, com faro para a inovação e para a contabilidade criativa. Veiga já não é um ex-ascensorista de hotel luxemburguês, nem dá pontapés e caneladas na gramática. Ao invés, é um poeta que reinventa a linguagem, como Saramago fez à literatura. A sua seriedade, em tempos comparada à da Dona Branca, é agora imaculada. A sua assinatura vale tanto como os cheques do Banco de Portugal… depois de Bagão Félix passar por lá.
Simão é um futebolista com a coluna vertebral bem direita [arrghh! Que isto custa a dizer!], a postura de um justo, o desinteresse pelos bens terrenos de um beneditino. Nuno Gomes é um prodígio, e Miccoli é o melhor estrangeiro a actuar em Portugal desde que Monserrat Caballet deu um espectáculo no Casino do Estoril. Ricardo Rocha é um modelo de disciplina em campo, uma libélula que pisa o campo como se este fosse um nenúfar E o Petit passou a ser um guerreiro justo que, por vezes, esporadicamente, sem qualquer pinga de maldade, no calor da luta e no ardor da batalha, se excede ao de leve.
Já ao serviço do nosso novo clube, chorámos de amargura ontem com a eliminação da Grécia de Karagounis e soltámos gargalhadas de prazer com a qualificação d’ Angola, dos nossos Akwá e Mantorras. O conselho de disciplina da Liga, que em tempos ousámos criticar, é uma entidade mais recta do que a Camelot do rei Artur. Os processos sumaríssimos mais não são do que um castigo de todo impróprio para o clube do povo.
Senhor apostador do totobola, não hesite: para o jogo do próximo sábado, aposte claramente no 2, com a chancela do Mãos ao Ar.
E agora, com sua licença, vamos para a sala de desinfecção!

sexta-feira, outubro 07, 2005

Miguel, Miguel, Nobre Miguel

Miguel, defesa-direito do Valência, está de regresso à selecção nacional. Sempre justos, os promotores deste blogue tomaram em mãos a tarefa de despoluição do seu nome. Vamos narrar em verso a epopeia do craque, enobrecendo os seus gestos e garantindo-lhe a justiça que os homens lhe negam. Vamos pavimentar o solo que ele pisa com papoilas saltitantes. Vamos entoar os seus feitos de cavaleiro medieval com a veia descritiva de um Fernão Mendes Pinto.
A tradicional miopia clubística – que o Mãos ao Ar aliás condena com veemência… sempre que se manifesta contra nós – fez dele um mero interesseiro, um chupa-sangue da pior espécie. No Mãos ao Ar, Miguel chegou a porto seguro. Para nós, ele é feito da mesma massa dos cabrais. Ele é um D. Quixote cavalgando pela sua Dolcineia. Um marinheiro quinhentista fugindo do seu adamastor. Um guerreiro alado que despertou os piores monstros do planeta (refiro-me aqui aos adeptos do Benfica. As verdades são para ser ditas).
Em exclusivo nacional, descodificámos por fim a intragável exortação de Miguel Torga. Quando o escritor diz:
"Em nome do teu nome,
Que é viril,
E leal,
E limpo, na concisa brevidade
— Homem, lembra-te bem —!
Sê viril,
E leal,
E limpo, na concisa condição."

Era a Miguel que ele se referia.

Quando Torga explica:
"Traz à compreensão
Todos os sentimentos recalcados
De que te sentes dono envergonhado;"

É de Luís Filipe Vieira que o escritor falava.

Quando Torga reconhece:
"Leva, doirado,
O sol da consciência
Às íntimas funduras do teu ser,
Onde moram
Esses monstros que temes enfrentar."

Eram os Diabos Vermelhos que ele comentava.

Só não concordo com as palavras finais. Diz Torga:
"Os leões da caverna só devoram
Quem os ouve rugir e se recusa a entrar..."

Tenham lá paciência, mas era o que nos faltava: receber o Miguel em Alvalade. Para monstros chupistas, já lá tivemos o Jardel.

quarta-feira, outubro 05, 2005

Vamos a isso, Ruanda

Já me está a chatear esta pseudo-unanimidade em torno da qualificação de Angola para o próximo Campeonato do Mundo. Os nossos pitorescos jornais desportivos fazem disso uma bandeira e seguem os estágios dos "palancas" pela Amadora, pelo Bessa, por todo o lado. Não quero saber! É-me indiferente se se apura Angola (que tem de ganhar o último jogo no Ruanda) ou Nigéria (que está dependente desse jogo para poder seguir para a Alemanha). Não quero saber se os responsáveis angolanos temem que o "polvo nigeriano" (palavra que li isto, não inventei) está a mexer os cordelinhos para que os jogadores do Ruanda, essas feras que não dão quartel, joguem cheios de motivação. É-me indiferente o Hotel do Ruanda em que a equipa angolana vai pernoitar. Não ligo a nada do que estrelas do quilate de Mendonça ou Akwá têm a dizer. A situação de desempregado do guarda-redes João não me comove.
Se me permitem o desabafo, de tanta intoxicação mediática, já acendi uma velinha pelo Ruanda. Vamos a eles, rapazes. Vamos fazer do caldeirão de Kigali um inferno. Allez.

O Português Suave

Há treinadores que nascem grandes. Outros, empreendedores, tornam-se grandes. A outros ainda é-lhes atirada a grandeza, mas falham o golpe, esbajam-no por falta de ousadia. Jesualdo Ferreira é um digno representante desta terceira categoria.
Defendo firmemente que o que somos profissionalmente mais não é do que o espelho do que fomos em criança - virtudes e defeitos exacerbados. Jesualdo Ferreira toda a vida foi medroso. Temeu os riscos, evitou-os. Na escola, preferia seguramente entregar o dinheiro e bens aos rufias do que arriscar um confronto. É o típico automobilista que assume a responsabilidade da colisão, mesmo que ela não lhe pertença, só porque sente as pernas fraquejarem sempre que tem de esgrimir argumentos.
Foi professor no ISEF, e a cátedra, sempre incontestada, assentava-lhe como uma luva.
Quis petiscar sem arriscar, eterno desígnio dos pobres de espírito. Raramente o fez. Foi adjunto durante uma eternidade, sem ousar dar o passo seguinte, aquele que inevitavelmente lhe colocaria a cabeça no cutelo. Outros que o fizessem, porque a penumbra é mais confortável.
Faz-me sempre lembrar os gauleses da aldeia de Astérix, temerosos que o céu lhes caia em cima da cabeça, se ousarem desviar-se, um milímetro que seja, da normalidade.
A história do país está repleta destes portugueses suaves, que tremem como varas verdes perante os desafios e recuam em vez de avançar. No banco, aborda o jogo com cobardia. Escuda-se no princípio de que mais vale não sofrer golos do que marcá-los. As suas equipas são maçadoras, sonolentas. Acumulam faltas, jogam mal. Transformam o futebol num jogo de paciência, como o xadrez ou o gamão.
A eliminatória com o Estrela Vermelha foi exemplar. Desde o primeiro minuto do primeiro jogo, Jesualdo lutou por não sofrer golos. A imbatilidade é a sua bandeira. Tapou todos os caminhos, estradas e ruelas para a baliza, mas esqueceu-se de atacar. Um golo cínico dos sérvios em Braga - tão cínicos como Jesualdo, aliás - deitou tudo a perder.
Elogiou-se muito o Sp. Braga do ano passado. A meu ver, as loas foram claramente exageradas. Em seis jogos com os "grandes", o Braga só marcou com o FC POrto (no Dragão, onde os deuses protegeram o ultradefensivo esquema dos minhotos; e em Braga, beneficiando de erros arbitrais). Empatou a zero em Alvalade e na Luz e novamente com o Benfica em casa. A postura da equipa foi vergonhosa e incompatível com um candidato ao título. Tentou fazer o mesmo com o Sporting no Minho, mas o endiabrado Pinilla tirou-lhe as medidas.
Nas trincheiras de guerra, quando é dada a ordem de ataque, há sempre um soldado que fica para trás - receoso, queixoso. Torce o pé quando deve correr. Escorrega quando deve saltar em frente. Essa é a postura de Jesualdo no banco de suplentes. O risco é para os outros, os patetas. Ele é o calculista, eufemismo futebolístico para as sanguessugas que fazem do zero a zero uma religião.
Há três anos, ao comando do Benfica, Jesualdo perdeu com o Gondomar. Abordou o jogo com dois trincos - Petit e Andrade - e perdeu. Teve medo de ganhar. Hesitou. A lei da selva, nesse aspecto, é inquestionável: quando a fera sente medo na presa, salta-lhe para a jugular. Essa é a história da vida de Jesualdo Ferreira.

terça-feira, outubro 04, 2005

Assim Não Dá

Tolero tudo no Sporting. Tolero jogadores que não dão tudo dentro de campo. Suporto jogadores que mais não são do que bonecos anatomicamente incorrectos, como Paíto ou Hugo. Suporto exibições descoloridas, desgarradas, desacertadas, infelizes. Suporto dias infelizes e gestos técnicos deficientes. Suporto a bola na barra e o penalty falhado. Suporto perder porque faz parte do jogo. Até a burla qualificada dos trios de arbitragem aprendi a tolerar. É burlesca, faz parte do folclore nacional.
A gota que faz transbordar o copo é a cobardia. Essa, amigos, é insuportável. Rui Meireles e Paulo Andrade saíram mais cedo de Paços de Ferreira para não se cruzarem com adeptos e associados, para não terem de explicar à turba mais um resultado negativo. Saíram dez minutos antes do fim do jogo, descrentes na reviravolta (estava 2-0), sem confiança na equipa e no treinador. Demonstraram, talvez mais do que nunca, total inaptidão para perceber o que é a competição desportiva e o que são as necessidades de um plantel. Quando quem paga não acredita na capacidade dos empregados pouco mais há a dizer.
As fugas prematuras de Meireles e Andrade – dupla absurda de administradores cega como um morcego – são um espelho fiel do que é a SAD do Sporting hoje em dia. A mesma SAD que anuncia estar a negociar Douala no própria dia do confronto com a Udinese. A mesma SAD que vende o melhor central do plantel (Enakarhire) sem acautelar a sua substituição. A mesma SAD que dispensa um jogador contratado um mês antes (Manoel). A mesma SAD que trata os jogadores com mais anos de clube como lenços descartáveis. Nos dez minutos finais de Paços de Ferreira, esteve a explicação para grande parte das doenças do leão. E a cura é tão evidente…

segunda-feira, outubro 03, 2005

A História Ensina Umas Coisas

Diz a sabedoria popular que, contra factos, não há argumentos. A apreciação crítica das 72 épocas do Sporting no campeonato nacional realça uma tendência esclarecedora: o clube só tem êxito se treinado por um estrangeiro ou por um treinador português com vínculo afectivo e histórico ao Sporting.
Atentemos nesta demonstração. Nos últimos vinte anos, o Sporting foi campeão por duas vezes: na primeira, em 1999/2000, foi treinado por Augusto Inácio, ex-jogador do clube e sportinguista de coração; na segunda, em 2001/2002, foi dirigido pelo romeno Laszlo Boloni.
Recuemos mais uns anos. Em 1981/1982, foi o inglês Malcolm Allison que levou os "leões" ao título. Antes dele, em 1979/1980, coube a Fernando Mendes, também ele ex-jogador e sportinguista convicto, a honra de conquistar o ceptro.
Mais uns anos para trás na máquina do tempo. Em 1973/1974, Mário Lino conquistou a "dobradinha" e chegou às meias-finais de uma taça europeia. Como os seus sucessores, também Lino jogara no Sporting e também ele é sportinguista.
Em 1969/1970, a tendência manteve-se. Fernando Vaz, adepto e ex-jogador, levou o Sporting ao título. Igual desiderato em 1965/1966, com o brasileiro Otto Glória e o ex-jogador Juca. Juca, aliás, já vencera em 1961/1962, tornando-se o mais jovem de sempre a conquistar o campeonato.
No ocaso dos "violinos", em 1957/1958, o Sporting foi treinado por mais um estrangeiro – Enrique Fernandez. Continuamos para trás e a lógica mantém-se: em 19534/1954, foi o húngaro Joseph Szabo que comandou a equipa. Um ano antes, foi o inglês Randolph Galloway, o mesmo que já fora campeão também em 1951/1952 e 1950/1951.
Nos anos do "tri", entre 1946/1947 e 1948/1949, os leões foram sucessivamente treinados pelo inglês Robert Kelly e pela única excepção que encontro a esta lei: Cândido de Oliveira, ex-jogador do Casa Pia, foi bicampeão como treinador do Sporting.
Os dois primeiros títulos da história do clube foram conquistados com o húngaro Szabo ao leme da nau "verde e branca".
Serve para isto dizer que a fórmula foi encontrada há mais de setenta anos. Já não há nada para inventar: Peseiro não cumpre nenhum dos dois requisitos (nunca jogou no Sporting, nem tem passado afectivo com o clube e, muito menos, é estrangeiro) pelo que o seu lugar não é em Alvalade. Não me interpretem mal: ele não é o único culpado. Até acho que Peseiro é um Trapattoni... sem os árbitros. Mas que se tenha a história em mente quando se recrutar novo treinador.

domingo, outubro 02, 2005

Ode a Paíto

Paíto é um erro da natureza, um equivalente humano a um cão com três patas ou a uma planta com dois caules. É triste admiti-lo, mas Paíto é o mais sério candidato a pior defesa esquerdo da história do Sporting.
De memória, sem grande esforço de documentação, evoco as figuras tristemente celébres de Leal, Vinicius ou Balajic. Mas Paíto é pior. É consistentemente pior.
Na bancada, todos temos os nossos ódios de estimação, aqueles jogadores abomináveis que, entrados em campo, desfiguram a melhor das equipas e desequilibram a mais precisa das balanças. Paíto é o meu ódio de estimação, tal como Lima já o fora há quinze anos. Ou Lemajic há dez. Ou Gil Baiano há oito. E por aí fora.
Não lhe reconheço nenhuma virtude.
Comete erros de infantil – hoje como há três anos. Enerva-se com os assobios da bancada a ponto de a bola lhe queimar as chuteiras. É estruturalmente desconjuntado: ora corre mais rápido do que a bola, ora é lento de mais e a bola escapa-se-lhe. Centra como um invisual e remata com a precisão de um carabina sem mira.
Tudo isto seria de somenos se Paíto não jogasse. Mas, por desígnios da fortuna, essa deusa que teima em brincar com o Sporting, Paíto encontra sempre forma de jogar. O plantel está totalmente minado por lesões, mas Paíto não se magoa. Os concorrentes directos para a posição são suspensos por motivos disciplinares, mas Paíto não é castigado. Ele JOGA sempre.
No início da época, peguei-me com o Sancho por causa da dispensa do Rui Jorge e da manutenção do Paíto. Dizia o meu colega de bancada, de blog e agoiro especializado, que o moçambicano tinha enorme margem de progressão. E que Rui Jorge estava a milhas do que tinha sido há anos. Escrevo, pois, este post propositadamente um dia depois do malfadado jogo com o Halmstad. Parece óbvio hoje que 20% do Rui Jorge seriam sempre superiores ao Paíto na plenitude das suas capacidades. E é óbvio também que as capacidades cognitivas do Sancho também já não são o que eram...
Mesmo assim, na bancada, ainda há quem gabe a velocidade estonteante de Paíto em incursões disparatadas pelo flanco esquerdo. A esses digo, como Fernando Redondo, que um jogador não tem de fazer 10 segundos aos 100 metros. É a bola que tem de ser rápida! Mas isso Paíto nunca vai perceber. Nem o Sancho.

sábado, outubro 01, 2005

Exercício Onomatopeico

Do impagável blog Futebol Mesmo, retiro, com a devida vénia, o exercício onomatopeico do momento.

Experimente dizer, como os verdadeiros grunhos:
Nungum puru u Bunfucu!